sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

ANTEVENDO O FIM DOS POTENCIAIS HIDROÉTRICOS

HUGO SIQUEIRA


Florestas podem ser reconstituídas pelo plantio de novas árvores. Mas, e o potencial hidroelétrico, em que sentido é renovável? A classificação “renovável” atribuída a energia potencial hidroelétrica, em contraposição ao combustível como recurso limitado, não leva em conta o fato de que são grandezas distintas. Uma, o petróleo, é um estoque de energia, cujo montante é desconhecido, enquanto a energia potencial é uma quota atual de energia, reutilizável, mas cujo montante, bem determinado, se esgota rapidamente com a utilização dos saltos potenciais disponíveis. Não é acumulável e nem comporta acréscimos, o que torna a energia potencial um recurso muito mais limitado que o combustível. A energia de potenciais hidroelétricos foi tão barata e versátil, no princípio, que sobrepujou qualquer outra forma de produção de energia (inclusive as térmicas, no aspecto custo de capital), a ponto de atingir sua utilização plena nos países industrializados.
Não leva em conta tambem o fato de o combustível poder ser plantado, tambem uma forma de energia que pode ser “renovada” pela ação do homem em quantidade expressiva, limitada apenas à quantidade de terra disponível. Ao cultivar plantas energéticas como cana e florestas artificiais o homem exerce um efeito benéfico sobre o meio ambiente, repondo, de certa forma, aquilo que foi subtraído pela sua ação predatória do passado. Isto mostra que o combustível é uma fonte infinitamente mais abundante que a energia potencial disponível e a maior evidência desse fato é o preço atual dos combustíveis, tanto petróleo como combustível alternativo.
Outro fator não considerado nas análises de alternativas se relaciona ao custo ambiental e econômico propriamente dito. Não leva em conta, por exemplo, que o combustível cultivado é muito menos agressivo ao meio ambiente do que reservatórios de hidroelétricas de planície, pela garantia antecipada de saldo negativo de emissão de gases do efeito estufa. No aspecto econômico a vantagem da utilização do combustível em termoelétricas é muito mais significativa em razão do “regime de velocidade” em que a transformação se processa. Apesar de menos eficiente no aspecto termodinâmico, esta desvantagem é largamente compensada pela transformação em rotação padrão de 60 Hertz.
A importância do combustível, como fonte de energia, decorre do fato de ser transportável, de um lugar para outro, na forma de mercadoria, que pode ser cotada em bolsa, tal como o petróleo, uma comodity como outra qualquer. O combustível alternativo apresenta ainda a vantagem sobre outras formas de energia: o álcool requer o cultivo de plantas energéticas mais eficientes do que as naturais, cujo custo de produção, pronto para consumo (etanol), tende a ser inferior ao do petróleo bruto alem de menos poluente. É tambem um depósito de energia potencial, disponível a qualquer instante, independente do clima;
A produção de hidrogênio pode ser descentralizada, pelo uso da eletrólise junto a fontes hidroelétricas, sem emprego imediato, da mesma forma que a produção de comodities intensivas em energia elétrica (alumínio, estanho e aço). Ambas são formas indiretas de armazenamento de energia em forma de produto acabado que eliminam o problema do transporte de energia (elétrica) e matéria prima (minério bruto).
Constatamos que o combustível será ainda a forma de energia mais largamente utilizada no mundo todo, depois de os países industrializados terem utilizado completamente seus potenciais hidroelétricos. Continuarão na condição de grandes consumidores (70%), ainda que seu consumo per cápita venha decaindo, a despeito do crescimento econômico. Países industrializados continuarão aprimorando as alternativas renováveis de energia conhecida (eólica, de marés, de ondas, fotovoltaica, etc.) e desenvolvendo novas que é o seu papel como detentores de capital. Por incrível que pareça os maiores beneficiários de suas descobertas serão aqueles que ainda contam com fontes renováveis e baratas. Um bom exemplo é o desenvolvimento de carros elétricos que beneficiam muito mais os países que tenham energia hidroelétrica substituta dos combustíveis poluentes eliminados e produtora dos componentes de baterias (Lítio). O mesmo acontece com os carros a hidrogênio e células de combustível, pela facilidade da produção de hidrogênio por fontes renováveis e baratas. Ao contrário do que muitos pensam, o petróleo continuará abundante e a maior garantia de que os preços continuem estáveis é a expansão de combustíveis alternativos e o uso de alternativas renováveis que estão sendo continuamente desenvolvidas.
Graças aos abundantes recursos naturais os países em desenvolvimento como o Brasil, poderão se tornar virtuais exportadores indiretos de energia, seja pelos insumos produtores (álcool), seja pelos insumos básicos produzidos (lingotes de alumínio, estanho, ferro). O país tem em abundância os dois fatores: minérios eletro intensivos e energia hidroelétrica barata e limpa. Pode exportar minérios com energia elétrica incorporada ou exportar álcool para aquecimento e acionamento de veículos, ambos gastadores de petróleo. Estes são argumentos fortes que justificam a retirada dos subsídios. Se, de fato a globalização beneficia os países industrializados, deve contemplar tambem os países em desenvolvimento, eliminando o transporte inútil de matéria prima em favor da proteção do meio ambiente que é tambem um objetivo global.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Diferentes visões:

Lago de Furnas

Lago de Furnas
Pesqueiro do Areado