sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

ANTEVENDO O FIM DOS POTENCIAIS HIDROÉTRICOS

HUGO SIQUEIRA


Florestas podem ser reconstituídas pelo plantio de novas árvores. Mas, e o potencial hidroelétrico, em que sentido é renovável? A classificação “renovável” atribuída a energia potencial hidroelétrica, em contraposição ao combustível como recurso limitado, não leva em conta o fato de que são grandezas distintas. Uma, o petróleo, é um estoque de energia, cujo montante é desconhecido, enquanto a energia potencial é uma quota atual de energia, reutilizável, mas cujo montante, bem determinado, se esgota rapidamente com a utilização dos saltos potenciais disponíveis. Não é acumulável e nem comporta acréscimos, o que torna a energia potencial um recurso muito mais limitado que o combustível. A energia de potenciais hidroelétricos foi tão barata e versátil, no princípio, que sobrepujou qualquer outra forma de produção de energia (inclusive as térmicas, no aspecto custo de capital), a ponto de atingir sua utilização plena nos países industrializados.
Não leva em conta tambem o fato de o combustível poder ser plantado, tambem uma forma de energia que pode ser “renovada” pela ação do homem em quantidade expressiva, limitada apenas à quantidade de terra disponível. Ao cultivar plantas energéticas como cana e florestas artificiais o homem exerce um efeito benéfico sobre o meio ambiente, repondo, de certa forma, aquilo que foi subtraído pela sua ação predatória do passado. Isto mostra que o combustível é uma fonte infinitamente mais abundante que a energia potencial disponível e a maior evidência desse fato é o preço atual dos combustíveis, tanto petróleo como combustível alternativo.
Outro fator não considerado nas análises de alternativas se relaciona ao custo ambiental e econômico propriamente dito. Não leva em conta, por exemplo, que o combustível cultivado é muito menos agressivo ao meio ambiente do que reservatórios de hidroelétricas de planície, pela garantia antecipada de saldo negativo de emissão de gases do efeito estufa. No aspecto econômico a vantagem da utilização do combustível em termoelétricas é muito mais significativa em razão do “regime de velocidade” em que a transformação se processa. Apesar de menos eficiente no aspecto termodinâmico, esta desvantagem é largamente compensada pela transformação em rotação padrão de 60 Hertz.
A importância do combustível, como fonte de energia, decorre do fato de ser transportável, de um lugar para outro, na forma de mercadoria, que pode ser cotada em bolsa, tal como o petróleo, uma comodity como outra qualquer. O combustível alternativo apresenta ainda a vantagem sobre outras formas de energia: o álcool requer o cultivo de plantas energéticas mais eficientes do que as naturais, cujo custo de produção, pronto para consumo (etanol), tende a ser inferior ao do petróleo bruto alem de menos poluente. É tambem um depósito de energia potencial, disponível a qualquer instante, independente do clima;
A produção de hidrogênio pode ser descentralizada, pelo uso da eletrólise junto a fontes hidroelétricas, sem emprego imediato, da mesma forma que a produção de comodities intensivas em energia elétrica (alumínio, estanho e aço). Ambas são formas indiretas de armazenamento de energia em forma de produto acabado que eliminam o problema do transporte de energia (elétrica) e matéria prima (minério bruto).
Constatamos que o combustível será ainda a forma de energia mais largamente utilizada no mundo todo, depois de os países industrializados terem utilizado completamente seus potenciais hidroelétricos. Continuarão na condição de grandes consumidores (70%), ainda que seu consumo per cápita venha decaindo, a despeito do crescimento econômico. Países industrializados continuarão aprimorando as alternativas renováveis de energia conhecida (eólica, de marés, de ondas, fotovoltaica, etc.) e desenvolvendo novas que é o seu papel como detentores de capital. Por incrível que pareça os maiores beneficiários de suas descobertas serão aqueles que ainda contam com fontes renováveis e baratas. Um bom exemplo é o desenvolvimento de carros elétricos que beneficiam muito mais os países que tenham energia hidroelétrica substituta dos combustíveis poluentes eliminados e produtora dos componentes de baterias (Lítio). O mesmo acontece com os carros a hidrogênio e células de combustível, pela facilidade da produção de hidrogênio por fontes renováveis e baratas. Ao contrário do que muitos pensam, o petróleo continuará abundante e a maior garantia de que os preços continuem estáveis é a expansão de combustíveis alternativos e o uso de alternativas renováveis que estão sendo continuamente desenvolvidas.
Graças aos abundantes recursos naturais os países em desenvolvimento como o Brasil, poderão se tornar virtuais exportadores indiretos de energia, seja pelos insumos produtores (álcool), seja pelos insumos básicos produzidos (lingotes de alumínio, estanho, ferro). O país tem em abundância os dois fatores: minérios eletro intensivos e energia hidroelétrica barata e limpa. Pode exportar minérios com energia elétrica incorporada ou exportar álcool para aquecimento e acionamento de veículos, ambos gastadores de petróleo. Estes são argumentos fortes que justificam a retirada dos subsídios. Se, de fato a globalização beneficia os países industrializados, deve contemplar tambem os países em desenvolvimento, eliminando o transporte inútil de matéria prima em favor da proteção do meio ambiente que é tambem um objetivo global.

A FORÇA DOS PRINCÍPIOS

HUGO SIQUEIRA

O conceito chave da eficiência está relacionado com a velocidade: por serem velozes são econômicas, tal qual a moderna turbina de avião. Aos atuais preços do petróleo de 50 Centavos de Dólar o litro e taxa de juros de 12% ao ano, praticado pelo mercado, já são possíveis térmicas mais baratas, em todo o sentido, em relação às volumosas e lentas usinas hidroelétricas da Amazônia.
Um sistema elétrico não pode permanecer indefinidamente sem graves inconvenientes.
Como, fatalmente toda energia do futuro passará pela queima de algum combustível, este fato não representa desvantagem para os países em desenvolvimento, ao contrário dos países industrializados que recorrerão à energia nuclear, mais dispendiosa, para obterem energia de aquecimento. Quando houver predominância de térmicas nos países em desenvolvimento, hidroelétricas poderão afinal ficar livres do “critério de risco”, utilizado pelos planejadores na década de 50: as novas usinas hidroelétricas da Amazônia não precisarão estar condicionadas ao atendimento da carga em qualquer circunstância, como antes, quando o sistema foi exclusivamente hidroelétrico. Estas, bem como as atuais hidroelétricas, não serão mais responsáveis pelo atendimento das solicitações instantâneas da carga, que passará a ser suprida ocasionalmente pelas termoelétricas (de custo fixo mais baixo) que serão maioria. Tambem funcionarão a plena potência em todas as condições de vazão, a qual não precisa ser garantida. A “energia garantida” não precisará ser aquela do “Período Crítico”, mas a máxima que as hidroelétricas puderem produzir, em qualquer condição de vazão, limitada apenas à potência instalada de cada usina. Mesmo que não exista carga, esta poderá ser criada artificialmente para a produção sazonal, a baixo custo, de comodities metálicas de alto valor agregado, intensivas em energia elétrica (eletrólise a quente) ou mesmo ser armazenada em baterias para acionamento de carros elétricos ou na produção de hidrogênio e ar comprimido para acionamento de automóveis.
Termoelétricas permitirão reparar, de certa forma, o erro de perpetuar um sistema baseado em fonte única. As hidroelétricas atuais ficariam liberadas do “critério de risco” nos períodos prolongados de seca. É mais razoável economicamente correr risco com termoelétricas nestes períodos por terem custo de capital menor e, portanto, mais aptas para permanecerem ociosas em períodos chuvosos.

CONCLUSÕES:

HUGO SIQUEIRA
O baixo nível de atividade econômica, prevista com a recessão no mundo todo, privilegia as térmicas como solução provisória, que adia investimentos altos em hidroelétricas, no presente, aproveitando as boas condições de preço dos combustíveis atuais. Alem disso os maiores gastos de combustível ocorrerão a prazo, enquanto os custos de capital com hidroelétrica ocorrem no ato da decisão, portanto irreversíveis.
A fase dos grandes empreendimentos hidroelétricos está chegando ao fim em todo o mundo. Depois de utilizados os potenciais de baixo custo o ambiente se assemelha a um final de festa. A nova fase do suprimento de energia será, inelutavelmente, de origem térmica (convencional ou termonuclear). A pretensa abundância de potenciais na Bacia Amazônica não deve levar à repetição de projetos que hoje se mostram inviáveis pelo alto custo do dinheiro (taxa de juros). Esta é a imagem atual do Sistema Elétrico Brasileiro:
--Suprir energia através de termoelétricas a combustíveis líquidos e gasosos, provenientes da cana e madeira é a alternativa promissora do momento, especialmente nas condições atuais de taxas de juros perto de 20% ao ano (BNDES), praticadas pelo mercado, e preços do petróleo na faixa de 50 centavos de dólar o litro, equivalente à metade do preço por ocasião do primeiro choque, se considerada inflação do dólar (2% ao ano).
--Aproveitar o programa do álcool, que custou tanto sacrifício, para que o setor sucroalcooleiro não seja penalizado é a providência mais urgente, especialmente depois dos altos investimentos já realizados. Mas, sem dúvida alguma, a grande economia no suprimento de energia vai provir da “mudança de rumo” no que respeita à composição das fontes de suprimento de energia, ou seja, a utilização das termoelétricas, no sentido de potencializar as atuais fontes, de origem quase que exclusivamente hidroelétrica, e dos novos vetores energéticos: combustíveis líquidos e gasosos que farão funcionar as novas termoelétricas. Estes “novos rumos” fazem parte das estratégias de uso-final da energia, conforme preconizado pelo relatório premiado de José Goldenberg: produção sob novas formas (térmicas) para uso-final da energia.
Em última análise, o suprimento de energia por termoelétricas a combustível (líquido ou mesmo gás de petróleo) é uma alternativa que acompanha o desenvolvimento de tecnologias modernas no sentido de maiores velocidades em todos os setores. Todo esforço do empreendimento humano tem sido no sentido do aumento constante da velocidade, que constitui a tendência marcante do mundo moderno. Esta tendência é evidenciada pelas modernas turbinas dos jatos supersônicos, da incrível velocidade de escape dos foguetes, dos aparelhos de corte de cerâmica, das atuais brocas de dentista, dos automóveis e carros de corrida e, sobretudo, pelo aumento crescente da velocidade da informação. Assim como o mundo todo se desenvolveu graças ao aumento da velocidade da informação, o desenvolvimento correlato do setor secundário ocorre pelo crescimento da velocidade industrial das máquinas e conseqüente aumento da velocidade e rotação dos aparelhos produtores e consumidores de energia.
Se já existem turbinas velozes para avião, alimentadas por combustível líquido, por que não podem ser utilizadas para acionar geradores baratos em frequência de 60 Hertz ou maiores? Termoelétricas a combustíveis líquidos custam apenas 500 US$/kW instalado (dólares de 1960) e podem vir a custar menos com as pesquisas. Alem disso podem ser descentralizadas, não requerendo custosas linhas de transmissão nem reservatórios.
Algumas sugestões:
• O consumo de energia vai ser de origem térmica: 64 % nos Países industrializados de clima frio e 15% nos países em desenvolvimento. Não há alternativa -- como garantia antecipada de proteção ao meio ambiente -- senão o cultivo de plantas energéticas para a produção de combustível.
• Termonucleares são caras (US$8000/ kW instalado), por serem termodinamicamente inadequadas para todos os fins, de aquecimento e acionamento (94% do consumo mundial).
• Termoelétricas acionadas por combustível líquido são mais econômicas e menos agressivas do que hidroelétricas da Amazônia. São velozes e consomem combustível já cultivado.
• Usinas eólicas e de marés são visivelmente lentas para serem econômicas. Não é sensato que sejam utilizadas para fim de aquecimento. Pode ser utilizada em lugares remotos e liberar combustível de usinas térmicas.
• Se todos precisam queimar combustíveis, nada contra, desde que assumam o compromisso antecipado de cultivar plantas. Esta é uma proposta mais racional do que ameaçar países consumidores do combustível, que, de antemão sabemos que vão consumir.
• Não há nada de errado em utilizar combustível barato para fins de aquecimento O irracional seria utilizar energia nuclear e alternativa mais cara inadequadamente. Protelar alternativas caríssimas é uma atitude coerente dos países industrializados.
• Não há nada de errado em utilizar combustível barato em termoelétricas para fins de acionamento. O errado é utilizar energia hidroelétrica mais cara e agressiva ao meio ambiente. Protelar alternativas caras e agressivas é uma atitude coerente dos países em desenvolvimento.
• Se o consumo de combustível é inevitável, a solução racional que contempla custos ambientais e econômicos é a produção do combustível pelo cultivo antecipado de plantas energéticas nos mesmos níveis de custo do petróleo.
• Ironicamente, o aquecimento solar direto, que é, sem dúvida, a melhor forma de produzir calor, não está plenamente disponível para os que dele mais precisam: os países de clima frio. Nos países tropicais, é desnecessário.
• Explorar petróleo como matéria prima de exportação constitui um procedimento pouco inteligente, posto que, o petróleo é uma comodity como outra qualquer, cujo preço, 50 centavos de dólar o litro, é pouco superior ao da soja pronta para o consumo. Exportar petróleo bruto é como exportar comodities ou minérios, inclusive o etanol.
• Não faz sentido utilizar células de combustível para fins de aquecimento. Acresce que não existe tecnologia fotovoltaica para largo uso comercial.
• Quanto mais baixo o preço do combustível, maior o uso, obviamente, como fonte de aquecimento em substituição às hidroelétricas, termonucleares, turbinas eólicas e células de combustível. Mas agora, nem o preço baixo está estimulando seu uso.
• Apesar do uso intenso o estoque de petróleo continua uma incógnita. Petróleo e energia potencial (hidroelétrica) são grandezas distintas. Ao contrário do petróleo que constitui um estoque ancestral, toda energia potencial não utilizada do passado se perdeu definitivamente.
• Os recursos de biomassa são limitados pelas restrições ao uso da terra impostas pela baixa eficiência da fotossíntese. Em todas as florestas dos países em desenvolvimento o índice total de produção não chega a quatro TW (Terawat). Mas, é claro que a floresta natural não será utilizada como fonte de aquecimento. Pelo contrário, o cultivo de florestas artificiais é uma garantia da sua preservação e reposição daquilo que foi utilizado. Esse é o tributo a ser pago por países consumidores.
• O capital vai ser o fator mais escasso nos próximos anos de recessão e o combustível será o fator mais abundante. Não faz sentido construir hidroelétricas de custo elevado em todos os sentidos: ambiental e econômico.
• A experiência dos países industrializados está mostrando claramente o que vai acontecer no futuro, com a desmontagem de suas indústrias padronizadas, sincronizadas, maximizadas e centralizadas, característica do industrialismo que estão abandonando. Para não incorrer no erro de solução que hoje se mostra inadequado, os países em desenvolvimento devem tambem sacrificar seus “dinossauros”, que foram úteis enquanto duraram, sejam hidroelétricas volumosas ou o decantado sistema interligado, sincronizado e centralizado.
• Cerca de 80% da energia consumida no mundo todo proveem da queima de combustível e não há nenhuma evidência de que este fato possa ser modificado nas próximas décadas. É mais provável que o consumo de combustível para fim energético cresça do que o contrário. Não há razão objetiva que justifique gastar mais quando se pode gastar menos. Isso violaria o senso comum de racionalidade do país consumidor, industrializado ou não.
• A questão ambiental não é um fenômeno objetivo porque os custos da proteção ambiental não recaem igualmente sobre todos os países. Muitos países em desenvolvimento, a exemplo da China, Bulgária e da Índia, se permitem conviver com ambientes altamente poluídos, como contrapartida de melhores condições de vida. Não obstante esta consideração cabe demonstrar que a solução termoelétrica é tambem menos agressiva, e mais barata do que as alternativas termonucleares, eólicas, maremotriz e células solares fotovoltaicas.

TERMOELÉTRICAS MODERNAS

HUGO SIQUEIRA

Máquinas térmicas a vapor foram utilizadas com baixa eficiência, como fonte de energia de acionamento durante a revolução industrial, muito antes de a eletricidade ter sido inventada. Para se ter uma idéia de como o processo era arcaico, basta imaginar as locomotivas a lenha e carvão de 50 anos atrás: verdadeiras fábricas ambulantes, produtoras e consumidoras de vapor d’água para acionamento de locomoveis em uma só unidade. Em que pese a limitação de carregar o combustível, foram extremamente úteis para o desenvolvimento humano. Hoje, termoelétricas a vapor d’água constituem a base das transformações de grande parte de tecnologias alternativas, alardeadas como salvadoras da humanidade, razão porque não frutificam. Mas, a grande revolução ocorreu quando a energia elétrica passou a ser utilizada, como forma intermediária de energia, alcançando níveis de eficiência, economicidade e versatilidade jamais alcançada por qualquer outra forma de transformação.
Conquanto a termoelétrica a gás seja mais eficiente, muita energia ainda é perdida na forma de calor dos gases de escape e por isso não é utilizada isoladamente, de forma que sua utilização atual é na forma combinada com a termoelétrica a vapor, de maneira a aproveitar a energia dos gases de escape. Com esta combinação o rendimento do conjunto é substancial elevado (cogeração).
Nas fases iniciais de qualquer sistema elétrico a abundância de potenciais inexplorados oferece enorme oportunidade de escolha. Obviamente, são utilizados em primeiro lugar os de mais baixo custo, situados nas cabeceiras dos rios que compõem a bacia estudada. Estes primeiros potenciais tinham custos tão surpreendentemente baixos que chegam a custar menos que o custo total de termoelétricas. O custo da hidroeletricidade foi tão atrativo que levou ao esgotamento dos potenciais disponíveis, nos países industrializados, os quais acabaram tendo de optar por usinas termoelétricas mais dispendiosas. Profundas mudanças estruturais levaram os países industrializados a migrar em direção a nova fase das inovações da economia de serviços, terminado o industrialismo por volta de 1950, período no qual os paises em desenvolvimento estavam apenas ingressando. Esta mudança estrutural inverteu totalmente o papel de cada país no que respeita ao perfil do consumo. Países industrializados deixaram de ser produtores de bens industriais, diminuindo o consumo de energia de acionamento e passando a consumidores de energia de aquecimento e acionamento de veículos, daí a sua extrema dependência de petróleo. Países em desenvolvimento são os que mais necessitam de energia de acionamento para produção de bens industriais, por ainda permanecer na fase do industrialismo, do qual os industrializados estão migrando. Continuam, entretanto, dependendo de combustível para produção de alimentos, acentuando ainda mais a dependência mundial por combustível.

PREVISÕES

HUGO SIQUEIRA


• Termoelétricas a gás ou combustível líquido serão as substitutas naturais das atuais hidroelétricas em fase de extinção. Serão velozes como turbinas de avião, para aproveitar a transformação em regime de altas rotações. Para melhorar o processo termodinâmico deverão operar em conjunto com térmicas a vapor, de modo a constituir o conjunto “termoelétricas combinadas a gás e vapor” (cogeração), para recuperar investimentos em antigas térmicas a carvão, a óleo e biomassa de bagaço de cana. A melhor localização é junto às usinas de cana de açúcar e junto às termoelétricas a combustível fóssil (Piratininga, Candiota, etc.).
• Combustível líquido e gasoso derivado da cana e florestas artificiais constitui uma das alternativas mais promissoras para Pesquisa e desenvolvimento nos próximos anos.

A cana é uma planta energética por excelência. A produtividade anual média no Estado de São Paulo é de 85 toneladas de cana por hectare, enquanto que a produtividade do milho é de 10 toneladas e a da soja é de 4 toneladas por hectare. Tudo na cana é transformável em combustível, enquanto a soja, que é uma oleaginosa, pequena quantidade de energia pode fornecer. É por essa razão que não vale a pena extrair combustível de grãos de soja (ou de grãos de milho).
“Um bom substituto para o petróleo deve ser encontrado naquilo que constitui a sua origem que são as florestas e plantas energéticas. Se o petróleo constitui um depósito ancestral, as florestas são depósitos atuais”.

• As vantagens da utilização de termoelétricas podem não ser significativas do ponto de vista econômico, tornando indiferente a escolha, porque ainda existem hidroelétricas de custo relativamente baixo na periferia da planície Amazônica. Não há, entretanto, como prever os desdobramentos da crise atual, relativamente a escassez de crédito e preço de combustíveis. Uma coisa é certa: não está muito distante o dia em que hidroelétrica acabarão se tornando mais caras e difíceis de serem aceitas pela comunidade, diante das agressões ao meio ambiente, provocado pelos reservatórios inúteis.

Como conclusão, o petróleo tem uma sobrevida de pelo menos uns cem anos e não há nenhuma razão para que deixe de ser consumido, como fonte de aquecimento nos países industrializados, e de acionamento de veículos, nos países em desenvolvimento.

Crescimento per cápita do consumo de energia e PIB em %
Período 1973/85
Países OCED EE.UU. JAPÃO
Energia per cápita -6 -12 -6
PIB per cápita 21 17 46

Tabela 1 - Crescimento do consumo de energia e PIB per cápita nos países industrializados no período 197 a 1985.
A atual crise não decorre da falta de energia, mas é uma crise de abundância que reflete uma mudança de paradigma nos modos de viver da nova sociedade do mundo industrializado. Países industrializados não oferecem mais suporte aos países em desenvolvimento, os quais têm de procurar seu desenvolvimento por meios próprios. Países industrializados perderam o contato com a produção de bens industriais aos quais tentam retornar sem sucesso.As tentativas de incentivar o emprego em áreas tradicionais fracassam porque não são mais competitivos. No setor automobilístico perdem para os concorrentes do mundo em desenvolvimento, que não param de fabricar automóveis mais econômicos. Não faz sentido estimular uma agricultura, com apenas 2% da população no campo. Não faz sentido estimular montadoras para produzir veículos para ficarem parados e nem faz mais sentido estimular a construção de casas para famílias de tamanho decrescente.Se em pleno apogeu do inverno no hemisfério norte o preço do barril não consegue decolar, é sinal claro de que só os países em desenvolvimento não vão sustentar a demanda por petróleo.
Outras formas de energia alternativa não se prestam à maior necessidade dos países industrializados: o aquecimento de residências.
O petróleo é um produto abundante em relação a outras formas de energia e seu preço continuará em queda pela concorrência de combustível alternativo, mas, sobretudo porque seus maiores consumidores estão diminuindo o consumo espontaneamente, por ingressarem na nova economia dos serviços e alta tecnologia. Como representam 70% do consumo de energia no mundo, qualquer diminuição do consumo se torna bastante significativa.
Com a população estabilizada e o consumo per cápita de energia em declínio, os países industrializados não são mais os responsáveis pelo aumento da demanda de energia como mostra a tabela 1.

Petróleo e hidroeletricidade são grandezas distintas em muitos aspectos:
 Ambos dependem de capital para estarem prontas. Acontece que o petróleo, como estoque de energia potencial, pode continuar estocado, basta não explorar, enquanto a energia potencial das quedas d’água se esvai se não for utilizada.
 Uma, o petróleo, é estoque (integral), a outra, hidroeletricidade, é energia passageira, circunscrita ao tempo atual da ação direta dos raios solares (diferencial).
 O petróleo é um estoque de energia acumulada pela ação lenta e contínua da fotossíntese que perdurou por milhões de anos, cujo montante é desconhecido, enquanto a energia potencial das quedas d’água é uma quota atual de energia, renovada continuamente, mas cujo montante, bem determinado, se esgotou rapidamente com a utilização dos saltos potenciais disponíveis.
 A energia potencial das quedas d’água não comporta acréscimos é não é ainda acumulável, enquanto o petróleo está sempre disponível, o que torna a energia potencial das quedas um recurso muito mais limitado que o combustível.
 O modo mais barato de produzir trabalho mecânico é através da utilização dos potenciais hidroelétricos devido aos elevados rendimentos da transformação quando comparados ao rendimento de termoelétricas. Por outro lado, o modo mais barato de produzir aquecimento é através da queima direta de combustível (segundo princípio).
 Apesar do uso intenso o estoque de petróleo continua uma incógnita. Apesar da baixa eficiência, a fotossíntese acumulou incalculável estoque de energia sob forma de depósitos fósseis, enquanto que nos mesmos milhões de anos, a energia potencial das quedas d’água não acumulou nada, até que a primeira roda d’água fosse utilizada.
 O combustível é tambem uma forma de energia que pode ser “renovada” pela ação do homem, limitada apenas à quantidade de terra disponível. Ao cultivar plantas energéticas como cana e florestas artificiais o homem exerce um efeito benéfico sobre o meio ambiente, repondo, de certa forma, aquilo que foi subtraído por sua ação predatória do passado. Isto mostra que o combustível é uma fonte infinitamente mais abundante que a energia potencial disponível e a maior evidência desse fato é o preço atual dos combustíveis, tanto petróleo como combustível alternativo.
Em condições normais a opção por hidroelétricas seria preferencial em virtude de grandes reservas de potenciais inexplorados na região amazônica, especialmente no Rio Xingu, onde se encontra um dos melhores recursos potenciais do ponto de vista econômico (Belo Monte). Mas considerando que nos próximos anos haverá abundância de combustíveis, cujo preço em geral declinará com a baixa atividade econômica, a opção por termoelétricas a gás representa a mais oportuna alternativa em termos econômicos e ambientais, pelas seguintes razões:
 Permite adiar investimentos de capital enquanto durar a crise atual.
 Evita elevado investimento em “linhões” e reservatórios agressivos.
 Termoelétricas a álcool vão permitir a utilização da cana já plantada.
 Pesquisa e desenvolvimento em novas tecnologias permitirão o aproveitamento total da cana e de novos combustíveis líquidos e gasosos de biomassa de florestas cultivadas, para acionamento de termoelétricas de maior eficiência.
 Gás ou álcool são fontes preciosas de “calor de processo” para inúmeras empresas de uso institucional coletivo como hotéis, hospitais, bibliotecas, restaurantes, centros de abastecimento, frigoríficos, supermercados, madeireiras, etc, etc.
 Hidroelétricas e termoelétrica não são opções autoexclusivas, mas complementares. O Brasil ainda tem bons potenciais hidroelétricos inexplorados na bacia Amazônica (Xingu e Tapajós) capazes de produzir energia muito mais barata do que as licitadas no Rio Madeira, mas são muito controvertidas. Belo Monte, por exemplo, situada no encontro do cristalino com a planície Amazônica, tem boas condições geográficas que permitem um aproveitamento de queda apreciável, utilizando um reservatório pequeno em relação à grande capacidade de produzir energia. Não necessariamente precisa ser otimizado, do ponto de vista econômico. Uma boa solução de compromisso consiste no subaproveitamento (low profile), ou seja, utilizando menor altura de queda em benefício de melhores condições ambientais e sociais, nos moldes do critério que foi utilizado nas licitações do Rio Madeira. Há que ter em conta a redução dos custos ambientais, de barragem e reservatório que constituem o maior componente dos empreendimentos hidroelétricos atuais, o custo de vertedores permanecendo constante porque projetado para vazões seculares. Para reduzir o impacto do custo de capital em equipamento que se tornará mais elevado com altura menor, a instalação dos equipamentos pode ser escalonada no tempo e em quantidade maior, de modo a ter grandes fatores de capacidade, compatível com o funcionamento contínuo.
 O custo operacional de térmicas está em queda, devido a abundância de combustíveis, enquanto o custo de hidroelétricas está subindo, devido a escassez de capital. As condições de crédito favorecem as termoelétricas, cujo combustível precisa de maior proteção por ser mais intensivo em mão de obra. A complementação por termoelétricas permite melhor aproveitamento do atual sistema elétrico no sentido de oferecer garantia de suprimento com baixo investimento.

CONDIÇÕES ESTRUTURAIS

HUGO SIQUEIRA


O Brasil foi extremamente bem sucedido na exploração de seus recursos naturais energéticos, junto com o Canadá, Estados Unidos e Rússia. Foi dos que mais se beneficiou da revolução da descoberta da eletricidade no princípio do século passado, graças a constituição geográfica dos seus rios interiores, de forte integração regional. O planejamento do sistema elétrico, iniciado após o primeiro período de seca prolongada (1953 a 1956), foi profundamente marcado por este acontecimento. Foi muito eficiente a princípio, mas ao mesmo tempo conservador. Grande capacidade instalada associada a grande capacidade de armazenamento foram as condições que permitiram uma operação tranqüila e eficaz nos primeiros trinta anos, tanto no aspecto das variações de demanda como da energia, até que o sistema foi surpreendido pela repetição de um novo período crítico com redução expressiva de energia natural afluente as usinas. Simulações “posteriores” confirmam esta ocorrência.

Potenciais de baixo custo nas cabeceiras dos rios Grande e Paranaíba incentivaram a supermotorização das usinas em razão dos reduzidos custos incrementais das primeiras usinas, muito alem das necessidades naturais de atender ao fator de carga em torno de 0.55. Junte-se a isso uma grande capacidade de armazenamento de energia pelos reservatórios de Furnas e Itumbiara, adequadamente situados nas cabeceiras dos dois rios que, mesmo com baixos fatores de capacidade (em torno de 0.4) o sistema não encontrava condições de mercado suficiente para absorver o excesso de energia alem da acumulada nos reservatórios, de modo que muita água verteu nesse período fazendo o sistema parecer superdimensionado. Blecautes ocorrem com frequência em muitos países industrializados de modo que a ocorrência de apagões não constitui razão para crucificar os planejadores que atuaram com muito êxito por 40 anos sucessivos. A introdução de térmicas foi a reação natural, na ocasião, para fazer frente às más condições climáticas. A condição de país ainda essencialmente agrícola determinou a característica sazonal essencialmente variável da carga ao longo do ano, dia e semana.

A conveniência de complementação térmica evidentemente não decorre da escassez de recursos potenciais hidroelétricos, em um país que ainda dispõe de 80% de recursos inexplorados na Amazônia, alguns de apreciável altura de queda, economicamente viáveis. Termoelétricas não contemplam apenas a necessidade conjuntural do presente, mas é decorrência da perda de capacidade de regulação por reservatórios de acumulação que foram perdendo significado ao longo do tempo com a expansão através de novas hidroelétricas, sem aumento de reservatórios significativo. O acréscimo de Usinas com reservatórios de regulação apenas sazonal acabou reduzindo ao longo tempo a capacidade total dos reservatórios -- inicialmente em torno de 25 vezes em relação à energia natural afluente às usinas -- para cerca de apenas 6 vezes, até que um novo período de seca, com baixa energia natural afluente, ocasionou o apagão de 2001. Acresce ainda o fato, da extrema dificuldade em operar, em razão de profundas mudanças estruturais ocorridas no Brasil depois da década de 50.
Ora, os reservatórios de planície, característicos da região amazônica, são inadequados para efeito de regularização, alem do que o regime sazonal dos rios é o mesmo e por isso não complementar. O Brasil corre o risco de construir custosos linhões para integrar sistemas que não são complementares, nem são capazes de acrescentar reservatórios de regulação plurianual, portanto não integráveis. Afora estas limitações técnicas, acresce o fato de serem fortemente contestadas por condições socioambientais, o que torna o processo de licitação demorado. Isto vem acontecendo com a usina de Belo Monte que vem tendo restrições ridículas de reservatórios (400 km²) que nada significam em termos socioambientais, mas que tornam elevados os custos de equipamentos de uma boa opção.
A bacia Amazônica continua oferecendo ótimas oportunidades de investimentos privados, nacionais e estrangeiros, para a produção de comodities metálicas eletrointensivas, assim como a opção por térmicas no sistema atual tambem oferece as mesmas oportunidades diante da elevada capacidade instalada que pode ser liberada para a produção das mesmas comodities, com tarifas especiais.
Não podendo contar com reservatórios de acumulação de outras regiões, não resta alternativa senão a garantia de térmicas para ter em conta as mudanças climáticas, que constitui fenômeno probabilístico. A garantia por térmicas é muito mais efetiva, uma vez que o combustível já representa um estoque de energia acumulada, disponível a qualquer momento e independente de variações climáticas imprevisíveis da natureza. É muito provável que as mudanças estruturais venham a produzir na região Sul Sudeste um efeito semelhante ao acontecido nos países industrializados, isto é, uma diminuição das necessidades de energia com o crescimento econômico. Com a perda progressiva da capacidade de regulação por reservatórios e com a garantia oferecida por térmicas, quase toda energia que eventualmente seria vertida pode ser usada para economizar combustível nas térmicas, independente da necessidade de encher reservatórios de acumulação. A diversificação na composição da carga permitirá o alongamento do tempo de utilização das hidroelétricas naquelas cargas especiais de uso contínuo. Esse é o preço a ser pago para assegurar o suprimento que antes era feito por reservatórios de acumulação.
A contribuição das usinas de cogeração é positiva por ser complementar (colheita em período seco), mas ainda insuficiente. Para que se torne efetiva é preciso haver alguma compensação pelo fato de as usinas de álcool e açúcar, como entidades privadas, não se sentirem estimuladas a participar do processo, quando térmicas em geral são paralisadas por excesso de chuvas. Entretanto existem varias formas de compensação, uma vez que é do interesse geral.
Usinas de açúcar ainda utilizam usinas térmicas a vapor antigas, cujo processo termodinâmico tem baixa eficiência. Entretanto, Usineiros poderiam ser compensados, na forma de créditos facilitados, para aquisição de termoelétricas a gás mais eficiente, para operar em conjunto com as térmicas antigas, aproveitando a energia dos gases de escape (termoelétricas combinadas). Não se pode falar de eficiência de um processo que utiliza combustível sem valor de mercado. O rendimento que interessa no caso é o rendimento em termos monetários, isto é, reais de saída em relação aos reais de entrada. Como a queima direta do bagaço é mais eficiente para a produção de “calor de processo”, a melhor solução para os usineiros seria a venda do bagaço como insumo para indústria cerâmica que utiliza a queima direta do bagaço em “calor de processo”. Outro obstáculo a ser vencido reside no fato de a maioria das usinas e sistemas de transmissão ter sido privatizada, o que dificulta a operação.
É no mínimo surpreendente que, em um país com tantos recursos potenciais inexplorados, o sistema interligado atual não possa contar com estes recursos, seja porque são recursos de região de planície, inadequados e não complementares, seja porque são ambientalmente incorretos e tenha que recorrer a fontes térmicas mais custosas para aumentar sua capacidade de regulação plurianual, inclusive termonucleares. A importação de energia de outras fontes, externas ao sistema interligado, pode diminuir a dependência da energia natural afluente às usinas hidroelétricas atuais, mas não concorre para o aumento da capacidade de regulação por reservatórios de acumulação plurianual. O ideal de um sistema único interligado para todo o território brasileiro pode ser inatingível. Entretanto, nada impede que o suprimento de energia possa continuar de forma descentralizada, apenas vamos ter que gastar mais para contornar a imprevisibilidade do tempo. Países industrializados já passaram por estas circunstâncias limitadoras e há muito tempo são dependentes de térmicas.
Não constitui objetivo do sistema interligado atual a otimização de todos os recursos hidroelétricos pelo aproveitamento de energia indisponível ou vertida. Pelo contrário, no período inicial o planejamento se pautou por oferta antecipada de capacidade instalada e energia, pela utilização de potenciais adequados, de evidente economicidade. Hoje, o problema é de natureza mais estratégica do que simplesmente econômica. A estratégia de super oferta de energia armazenada em reservatórios, utilizada nos períodos iniciais, não pode ser repetida porque o sistema exauriu a sua capacidade interna e nem pode contar com reservatórios de regularização plurianual de outras regiões, por serem tecnicamente inadequados e não complementares.
A discussão em torno dos recursos da Amazônia é estéril porque está desfocada: antes de serem agressivos, os reservatórios são inadequados e impróprios, por se situarem em regiões de planície, alem do que não são complementares, mas coincidentes com o de outras regiões, especialmente a Sul Sudeste. Nem a opção por termoelétricas é capaz de eliminar as incertezas de um sistema intrinsecamente aleatório. Entretanto, é mais seguro: substitui uma garantia aleatória de armazenamento em reservatórios por garantia de armazenamento mais eficaz, dependente da ação deliberada do homem.

PESPECTIVAS BRASILEIRAS PROMISSORAS

HUGO SIQUERA
Atualmente, a maior pressão sobre recursos escassos ocorre pelo transporte excessivo de matéria prima, enquanto as maiores pressões sobre meio ambiente decorre da utilização de fontes ineficientes de energia para produzir bens de maior valor agregado. É claro que cada país vai procurar agregar valor de acordo com suas peculiaridades: aqueles que têm mão de obra barata procurarão atividades em que este recurso possa ser agregado (China, Índia); países com recursos naturais vão agregar valor em produtos que os utilizem; Países industrializados irão desenvolver tecnologia necessária a todos que dela necessitarem. A tendência natural preconizada por McLuhan é no sentido da fusão em mega-empresas transnacionais e a especialização de cada país nas suas aptidões peculiares. A globalização não é nenhuma novidade e não ocorre simultaneamente em todos os países. Já ocorreu no passado da indústria de bens intermediários (automotiva) e encontrou sua expressão maior nos dias atuais com a produção de bens tecnológicos. Está demorando, mas certamente vão ocorrer mudanças no setor primário, que constitui o foco das maiores pressões sobre recursos e natureza. O transporte excessivo de matéria prima e a produção de bens por meios ineficientes não é globalmente desejável para o mundo como um todo e a opinião publica mundial vai exercer pressão sobre aqueles países que adotem essas práticas. Aqueles que estiverem mais bem preparados serão os mais bens sucedidos, sem dúvida alguma.
Exemplos de práticas inadequadas:
• Produtos siderúrgicos e semi-acabados eletro intensivos em países que não dispõem de fontes adequadas (China, Índia, Bulgária, Estados Unidos).
• Carros elétricos em países que não dispõem de energia elétrica para acioná-los.
• “Revolução verde” em países que não tenham terras, condições climáticas e energia suficiente para patrociná-la (países industrializados).
• Agregação de valor em países que não dispõem de terra suficiente para criação de gado.

O país pode contar com enorme quantidade de energia de origem hidroelétrica para a produção de elementos estratégicos de grande valor econômico (Alumínio, estanho, hidrogênio, lítio), o que constitui um diferencial importante em relação aos países que precisam recorrer à energia proveniente de térmicas. O Brasil é um dos últimos detentores de potenciais hidráulicos e o que mais ganhou experiência na exploração de energia hidroelétrica na segunda metade do século passado.
A eletrólise é uma das formas mais freqüentes de uso da energia elétrica, que permite o seu armazenamento na forma dos produtos por ela produzidos, especialmente aquela de origem hidráulica. O Lítio, por exemplo, é o elemento essencial para fabricação de baterias leves, cuja tecnologia já é utilizada em celulares e notebooks. O hidrogênio pode ser utilizado em células de combustível. Ambos são obtidos por meio da eletrólise e servem como fontes para acionamento de veículos elétricos.

CONSTATAÇÕES ÓBVIAS SOBRE OS RUMOS DA POLÍTICA ENERGÉTICA (receita)

HUGO SIQUEIRA
1. É mais barato e seguro — em termos econômicos e ambientais — assegurar energia por termoelétricas a gás em “períodos secos” do que utilizar reservatórios de usinas hidroelétricas da Amazônia. Combustíveis já constituem estoques de energia disponível a qualquer instante para ter “energia garantida”, independente de condições climáticas e não oferecem risco sócio-ambiental dos extensos reservatórios das usinas da Amazônia
2. Imprimir um ritmo lento de exploração de petróleo e hidroelétricas na Amazônia bem ao estilo do que os americanos chamam de “Low Profile”.
3. Padronizar o tipo de turbina de fluxo d’água (bulbo) de modo a tornar adequada a todas as usinas grandes e pequenas, reduzindo o custo pela escala: pequenas com poucas unidades e maiores com mais unidades padrão.
4. Aumentar o cultivo de florestas artificiais, inclusive na Amazônia para produção siderúrgica e de combustíveis líquidos.
5. Pesquisa e desenvolvimento de combustíveis líquidos derivados da biomassa.
6. Pesquisa e desenvolvimento de turbinas velozes e Incentivo a fabricação de termoelétricas a gás, a álcool de cana e combustíveis líquidos
7. Manter estoque de petróleo para fabricação de adubo nitrogenado e plástico.
8. Assegurar energia por termoelétricas a gás em lugar de reservatórios na Amazônia.
9. A melhor localização de termoelétricas a gás é junto às usinas de açúcar e álcool ou térmicas convencionais a vapor (Candiota e Piratininga) para reduzir o consumo de carvão mineral e bagaço de cana (térmicas combinadas de cogeração)
10. Destinar bagaço de cana em atividades que utilizam “calor de processo” em vez de combustível para térmicas a vapor.
11. Substituir frota de carros a gasolina nas grandes cidades por modelos híbridos álcool-elétricos ou acionados por hidrogênio.

O CULTO DA TECNOLOGIA

HUGO SIQUERA

A primeira forma, só mudar de atividade, não é o bastante. Significa transferir a outros a responsabilidade de produzir transporte e alimento para atender necessidades mais prosaicas de alimentação e aquecimento de novos consumidores. Afinal, nem todos poderão mudar para outras atividades ao mesmo tempo. Alguns permanecerão responsáveis pelo trabalho pesado, consumidor de energia. Os países industrializados poderão comprar energia, trocando por produtos tecnológicos (quinquilharias eletrônicas), ou então, produzir sua própria energia nuclear (ineficiente para aquecimento) a preços muito mais elevados (cerca de 6000 dólares por Quilowat). Este é o grande problema dos países industrializados: alem de gerar desemprego nos países de origem, seu mercado não é grande o suficiente para se auto-alimentar. Tem que ser impingido aos países em desenvolvimento como nova forma de colonialismo. Ao comprarem estes produtos de prematura obsolescência, os países em desenvolvimento pagam uma espécie de tributo pelo “culto da nova tecnologia”. Um computador ou celular com seis meses de uso, não vale absolutamente nada.
É surpreendente que as novas tecnologias da informação e da eletrônica, que produziram tantos resultados, tenham encontrado apenas soluções parciais para problemas, que pareciam menores, como aqueles relacionados com a vida do ser humano concretas, no sentido mais estreito da palavra: sua existência animal e primitiva, como alimentação, aquecimento, circulação e transporte. Atividades biológicas do ser humano concretas exigem gasto de energia que não pode ser suprida apenas por alta tecnologia. O transporte e energia, não podem ser virtuais.
A novíssima tecnologia da biogenética já está produzindo aumentos substanciais de produtividade nas plantações de cana e florestas cultivadas. Utilizada no Brasil em florestas cultivadas (clones de eucalipto) aumentou a produtividade da indústria do aço a partir do carvão vegetal em mais de cinco vezes. No futuro próximo, quando esta tecnologia tiver maior aceitação por parte do público, talvez venha a mudar todo o panorama da produção de alimentos protéicos.
“Os países em desenvolvimento não deveriam trilhar os mesmos caminhos de desenvolvimento do Norte, mas buscar novas direções e assumir os riscos da inovação em áreas especialmente promissoras”.
Por incrível que possa parecer, a mais valiosa fonte de energia permanece subutilizada: “o uso mais eficiente no uso-final da energia disponível e a escolha das alternativas promissoras de produção e seus vetores energéticos”. José Goldenberg (Energia para o desenvolvimento, 1988) e (An End-use Oriented global Energy Strategy,” Annual Review of Energy, 1985) citado no trabalho “Energy for a sustainable World” do World Resource Institute.


A região amazônica não deve ser vista do ponto de vista estreito de cada uma de suas riquezas presumidas, mais de uma forma sistêmica do conjunto de suas riquezas e problemas que se complementam. Assim, por exemplo, ao invés de licitar hidroelétricas para ser dado de “mão beijada” às empresas de produto eletro-intensivo, licitar o conjunto, usina, minérios, navegação, etc., com vinculação de royalties e limitação de áreas inundadas. A usina de Belo Monte reúne as condições para se tornar objeto de uma licitação do tipo sugerido.

EXPLORAÇÃO DOS POTENCIAIS HIDROELÉTRICOS

HUGO SIQUEIRA


Uma história de bois, petróleo e eletricidade

O melhor jeito de guardar milho barato é em sacos de couro..., de porco..., vivo.
O lugar mais indicado para estocar petróleo barato é embaixo da terra.
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O CULTO DO PLANEJAMENTO

O desenvolvimento dos países industrializados de hoje aconteceu sob condições inteiramente diversas. Os conhecimentos da época eram escassos, de forma que, considerações de eficiência não eram relevantes (o problema não continha os clássicos limites das condições de contorno). As mudanças ocorriam em ciclos estáveis que cabiam dentro do prazo de vida de uma pessoa, no decorrer de um industrialismo, que durou cerca de 300 anos. Um exemplo: as locomotivas a lenha de 1950 eram verdadeiras fábricas ambulantes, devoradoras de lenha e a vapor, de rendimento baixíssimo para acionar pistões. Hoje, com as mudanças ocorrendo a ciclos cada vez menores, qualquer trabalho que leve mais de cinco anos, será obsoleto na publicação.
Parafraseando Marshall McLuhan, o papa da comunicação, poderíamos dizer:
“Não há um futuro previsível para o qual se possa preparar algum país para enfrentar a globalização, que é um fenômeno recente. A tecnologia, em sua permanente criatividade, levou de roldão a estabilidade cíclica dos sistemas simbólicos (arquiteturas puramente ideológicas)” (Marshall McLuhan). Foi a estratificação do industrialismo que criou a necessidade do planejamento. O planejamento foi mais um instrumento de imobilização da vida (desestimulação da criatividade) do que fator de reequilibração permanente. Os planos tinham por objetivo evitar a invenção. Velhos conceitos, puramente ideológicos: livre mercado, estatais, liberalismo, perderam totalmente o sentido com o fim das ideologias e o fim da história A palavra de ordem agora é “cooperação espontânea”. Como planejar um futuro, vivendo dentro das mudanças, que são verdadeiras mutações acontecendo e das quais não damos conta no tumulto das mudanças profundas? A atual crise vem demonstrando que os países não têm poder de ação relativamente às suas empresas transnacionais, cujos interesses se encontram mais fora de seus países de origem. Até países em desenvolvimento estão criando suas empresas Multiestatais (parece uma heresia): a Petrobrás, por exemplo.

O ARMAZENAMENTO DE ENERGIA

HUGO SIQUEIRA

O armazenamento de energia por meio de grandes reservatórios de acumulação foi a estratégia bem sucedida para ter “energia garantida”. Mas os reservatórios atuais vêm perdendo progressivamente a capacidade de contribuir para a autoregulação e a construção de novos encontra fortes restrições sócio-ambientais, de forma que, a mesma estratégia não pode mais ser repetida nas novas usinas. Garantir energia nos períodos secos se tornou mais fácil nos dias de hoje com termoelétricas a gás de menor custo de capital. A utilização de reserva de “energia garantida” por termoelétrica é uma solução mais ecológica e mais barata por mais incrível que possa parecer: é eficaz porque o combustível (gás ou combustível líquido) por elas utilizado já é um estoque de energia potencial, disponível a qualquer tempo, independente de condições climáticas.
O sistema elétrico brasileiro foi projetado no século passado, seguindo uma estratégia de sucesso que consistia no emprego de reservatórios de regularização plurianual aliado a usinas supermotorizadas, ambos de custo excepcionalmente baixo, graças ao relevo. No Norte acontece justamente o contrário e a mesma estratégia não pode ser repetida, devido tambem ao relevo: Os reservatórios são caros e ambientalmente incorretos, pela elevada relação superfície volume. O mesmo acontece com os equipamentos, turbina e gerador devido a baixa altura. Acresce ainda o fato de que as alturas precisarão ser reduzidas para não inundar mais do que as enchentes naturais, o que agrava ainda mais o custo dos equipamentos.Tanto no Norte como no Sudeste o país pode contar com enorme quantidade de energia de origem hidroelétrica para a produção de elementos estratégicos de grande valor econômico (Alumínio, estanho, hidrogênio, lítio), o que constitui um diferencial importante em relação aos países que precisam recorrer à energia mais dispendiosa de térmicas. O Brasil é um dos últimos detentores de potenciais hidráulicos e o que mais ganhou experiência na exploração de energia hidroelétrica na segunda metade do século passado.
A eletrólise é uma das formas mais freqüentes de uso da energia elétrica, que permite o seu armazenamento na forma dos produtos por ela produzidos, especialmente aquela de origem hidráulica. O Lítio, por exemplo, é o elemento essencial para fabricação de baterias leves, cuja tecnologia já é utilizada em celulares e notebooks. O hidrogênio pode ser utilizado em células de combustível. Ambos são obtidos por meio da eletrólise e servem como fontes para acionamento de veículos elétricos.
No momento, o Brasil deve concentrar pesquisas em tecnologia de aproveitamento total da cana de açúcar e da biomassa de florestas cultivadas para produção de combustível líquido, como alternativa da queima direta do bagaço em antigas termoelétricas a vapor, verdadeira “reminiscência arqueológica” do industrialismo. Estas devem ser substituídas por termoelétricas combinadas (Candiota, Piratininga, e usinas de cogeração existentes nas usinas de açúcar e álcool) e o bagaço teria aplicação mais eficiente em “calor de processo” como a indústria cerâmica e de vidro.
A segunda necessidade brasileira é garantir a produção de álcool para a para acionamento de carros e termoelétricas, alem da venda do combustível e experiência de fabricação para outros países. Para que tenha terra suficiente é preciso reduzir o rebanho de bovinos, tanto na Amazônia, quanto no cerrado. A redução do rebanho é possível, com a experiência brasileira de mais de 300 anos, que pode ser acelerada com a descrição recente do genoma do gado. Com isso, o Brasil pode se transformar em exportador de tecnologia de garrotes precoces (semem, reprodutores e matrizes).
A engorda extensiva de bois é o maior responsável pela degradação de pastagens que já atinge a região Amazônica. Alem do pequeno valor agregado, exportação de carne por bois criados extensivamente significa perda de patrimônio. A exportação de matéria prima é um forte concorrente pela utilização de recursos escassos ou ambientalmente incorretos. Ora, tanto o cultivo de grãos quanto cana é uma atividade mais correta e lucrativa do que as anteriores. Logo, a providência mais sensata seria limitar o rebanho, produzindo carne de bois confinados e evitar o transporte de matéria prima, exportando produtos acabados de maior valor agregado. Globalmente a exportação de matéria prima não beneficia ninguém, concorre apenas para o agravamento das condições ambientais e maior utilização de recursos escassos: minério, grãos e carne. Minério e grãos exigem combustível no transporte de mercadorias pesadas para países que vão utilizá-los de modo ineficiente. Já a carne, incentiva a criação extensiva de gado, maior vilão das queimadas e concorrente do boi confinado. Isto é o “óbvio ululante”.
Como a energia elétrica é o nosso fator mais favorável, deve ser usada para impedir tais exportações. Por exemplo: na Amazônia, para produzir eletro intensivo e no Sudeste, para acionamento de carros elétricos. O álcool tem grande potencial exportador, tanto o combustível como 40 anos de experiência tecnológica. Só nos Estados Unidos a necessidade de adição é seis vezes a produção brasileira. O Brasil tem condição de se tornar o maior fornecedor de gado confinado, ou seja, exportador do boi já alimentado com o grão de origem.
Indiretamente, os responsáveis pelas más condições ambientais são os importadores de carne e minérios brutos da Amazônia, impedindo que sejam processados aqui, de maneira mais eficiente. Se bens tecnológicos podem ter produção globalizada, o mesmo não acontece com bens primários, sem comprometer o meio ambiente. Portanto, limitar a exportação de carne e minério bruto da Amazônia, não apenas é um bom negócio, como é essencial para a sua preservação

O NACIONALISMO DE VOLTA

HUGO SIQUEIRA



As novas descobertas do Pré-sal vêm dando margem para o ressurgimento do velho nacionalismo que alimentou o imaginário do povo brasileiro na década de 50. Hoje vistas como “redenção da pobreza” vão servir muito mais como bandeira política, do que realmente geração de riqueza, diante da montanha de capital necessário à exploração.
“Coincidência ou não, no mesmo dia do lançamento do pré-sal, começava em Londres o, digamos, pós-sal – campanha chamada 10:10, porque visa reduzir em 10% a emissão de gases -- cujo último fim fatalmente será o de um mundo com muito menos consumo de petróleo e derivados, sabidamente os principais vilões nessa história, seguidos pelo desmatamento” (Clovis Rossi, folha do dia 2/9/2009). Não é para criticar o pré-sal, ao contrário: mesmo que o petróleo tenha uma sobrevida de algumas décadas, o Brasil é um dos raros países, senão o único, com a imperdível oportunidade de usar os recursos (grana) provenientes de um combustível ‘sujo’, para desenvolver e/ou consolidar as alternativas ‘limpas’ que possui (álcool e potenciais hidroelétricos). “Ou então, usar o recurso combustível ‘sujo’ (em espécie) para acionamento de termoelétricas a gás que liberam energia limpa” e barata de hidroelétricas — nossa maior riqueza potencial — para acionamento de carros elétricos ou a hidrogênio?
Se o preço do petróleo vai realmente subir, conforme esperam os técnicos da Petrobras, porque não esperar que isso aconteça primeiro, para depois explorar, deixando o petróleo bem guardado debaixo da terra e do mar? O quê, definitivamente, não é fácil de ser roubado. A “subutilização das reservas” ao longo do tempo é o equivalente em petróleo da subutilização (low profile) das hidroelétricas da Amazônia, ou seja, produção de gás, diesel e nafta na quantidade suficiente para atendimento do mercado interno. É o que parece mais sensato nestes tempos de petróleo barato, sem as complicadas manobras de “aumento de capital da Petrobras, emissão de títulos da dívida e pagamentos em barris fictícios do futuro, tal como o “negócio da China de 10 bilhões”, que nada têm a ver com a indústria do petróleo.
A tal “Doença holandesa” de que tanto falam atualmente já aconteceu muitas vezes na história do Brasil colonial — como expressa o recente discurso do senador Cristovam Buarque sobre os inúmeros ciclos da “borracha”, “cana de açúcar”, “mineração”, “café” — cujos benefícios reverteram apenas ao propósito de construção de edifícios suntuosos: teatro, igrejas, palacetes e edifícios, como expressão do poder dos senhores de engenho, barões da borracha e do café. A atual crise da economia globalizada guarda uma certa semelhança com a “maldição do petróleo” e pode ser atribuída à “febre consumista da era da modernidade”.

HISTÓRICO

Desde a criação da Petrobras nos idos de 50 – sob forte apelo nacionalista da campanha do “petróleo é nosso” – jamais imaginaríamos que o Brasil tivesse petróleo. No curto período de pouco mais de vinte anos implantamos – em cooperação com países industrializados – uma indústria automobilística exitosa sem ter petróleo, até sermos surpreendidos pelo primeiro choque em 1973, quando o preço do barril atingiu a marca de hoje: aproximadamente 70 dólares, que corresponde ao dobro do valor atual se considerar a desvalorização do dólar no período (2% em 35 anos ou 3% em 24).
No mesmo período o país foi muito bem sucedido na implantação de um sistema elétrico quase perfeito, não fora a enorme dívida acumulada que levou a uma condição insustentável de comprometer mais de 50% das exportações, pela política dos juros altos imposta pelo governo Reagan. Não bastasse esse fato o país investiu pesado no programa do álcool, cujo acerto ficou definitivamente comprovado no final da década de 70. O país crescia a taxas surpreendentes de quase 14%, superando os “Tigres Asiáticos. Em seguida o Brasil entrou em uma fase de estagnação econômica com taxas de crescimento medíocre. Vieram os sucessivos planos heterodoxos que todos conhecem cujos detalhes não importa relatar aqui, nem seus autores. Somente após 94 o país conseguiu se firmar, depois de um processo de privatização de empresas do setor público que culminou com a extinção do monopólio e abertura do capital da Petrobras ao público, com ações em bolsa de valores, inclusive com participação de capital estrangeiro.
O que importa reconhecer é que – independente da ideologia do governo de plantão – Os três programas alcançaram êxito bastante satisfatório até os dias de hoje:
• O Sistema elétrico completou o ciclo de aproveitamento de todos os potenciais da Região Sudeste, com a colocação das duas últimas turbinas de Itaipu.
• O programa do álcool atingiu a máxima substituição de gasolina com a fabricação dos carros “Flex.”, totalmente a álcool ou gasolina aditivada.
• A Petrobras se firmou como empresa multinacional de eficiência reconhecida no mundo inteiro. Hoje cerca de 70% do capital está em mãos de trabalhadores através do FGTS, investidores nacionais e estrangeiros, cujas ações, cotadas na bolsa de Nova York, valorizaram substancialmente.
Hoje temos petróleo do “Pré-sal”: — Não é surpreendente? É o caso de questionar:
• Porque não deixar as coisas seguirem seu curso natural ao invés de pegar de surpresa um congresso em crise de legitimação?
• Qual a razão do açodamento no prazo 90 dias de um projeto que durou quase dois anos para ficar pronto, sem a nenhuma segurança acerca dos riscos inerentes a um processo inteiramente novo.
• Que seja a Petrobrás a maior beneficiária na exploração, não temos dúvida alguma, mas daí retroceder ao velho e surrado nacionalismo dos anos 50 vai uma diferença muito grande: até parece aquele doido Bolivariano ameaçando.
• Como impedir que outros sócios que acreditaram no sucesso da Petrobrás mantenham a participação original e que talvez não concordem com os propósitos e fins da companhia outra vez nacionalizada?
• Como bons capitalistas alguns talvez aceitem de bom grado o “guarda chuva protetor” que governo oferece, outros nem tanto: afinal são sócios estrangeiros que podem não querer se comprometer com os propósitos nacionalistas de governos latino-americanos como aqueles que nacionalizaram empresas brasileiras como a própria Petrobras. Afinal já fizemos isso antes quando nacionalizamos as empresas canadenses do setor elétrico, se lembram?
• Como fica a situação de todos os trabalhadores, cujos fundos de garantia não rendem nada, ou menos que nada? Permanecerão com suas aplicações desvalorizando eternamente? E outros sócios que não têm meios de completar sua cota, terão dividendos diluídos?
Petróleo e carvão são responsáveis por 92% da energia consumida nos países industrializados — os maiores consumidores — depois de terem esgotado todos os potenciais hidroelétricos. Países em desenvolvimento queimam petróleo e biomassa na produção e transporte de alimentos (30%). São os únicos a ter potenciais ainda inexplorados de hidroeletricidade, conquanto na quantidade reduzida de 700. 000 Mw.
A queima direta do combustível é a forma natural e eficaz de produzir energia, especialmente para o fim precípuo de produzir aquecimento de residências, maior componente do consumo dos países industrializados de clima frio (58%). A queima direta do combustível não requer investimento e toda energia química contida no combustível é transformada quase integralmente, de acordo com o segundo princípio da termodinâmica. Nada impede, entretanto, que sejam utilizadas outras fontes de maior custo, como termonucleares para produzir aquecimento. Em outras aplicações, como o acionamento de máquinas e veículos a queima de combustível é ineficiente porque a maior parte da energia é perdida sob forma de calor e o rendimento da transformação, em termos de energia mecânica, é muito baixo.
O segundo maior componente do consumo dos países industrializados é o transporte (34%), incluído o transporte individual. Como meio de transporte, entretanto, o automóvel é um modo caro e ineficiente: a maior parte do custo se refere aos opcionais de conforto e apenas parte energia consumida se transforma em energia útil, o restante é perdida em refrigeração e lubrificação do motor e dispositivos de conforto.

É claro que o progressivo encarecimento das novas prospecções de petróleo em mar profundo e o maior custo das hidroelétricas das regiões de planície vai tornar competitiva a energia de outras fontes alternativas, liberando energia para fim de aquecimento e encorajando as pesquisas. Já são possíveis tecnologias que permitam o aproveitamento total da cana bem como a produção de combustível a partir da biomassa de floresta cultivada, cuja produtividade aumentou expressivamente com emprego da biotecnologia.
Os países industrializados podem economizar energia de aquecimento, pois têm condições de adotar tecnologias mais eficientes. Afinal, detendo 70 por cento da energia gasta no mundo todo, tem mais onde cortar. Tambem dispõem de capital para bancar nucleares mais caras, no caso mais extremo. Por mais que economizem energia no uso final, entretanto, ainda continuam grandes consumidores: consomem mais energia de aquecimento que os países em desenvolvimento consomem em alimentação Ao contrário, os países em desenvolvimento, vão ter de produzir os seus próprios combustíveis e, sobretudo, os alimentos (grãos) para alguns países industrializados e emergentes.
Em países tropicais o custo do aquecedor solar é cerca de um terço do equivalente ao suprimento por novas hidroelétricas e deveria ser subsidiado, tal como vem acontecendo no programa “energia para todos” e “irrigação noturna” que não requerem nenhum suprimento extra pela sua característica inerente.

PERSPETIVAS DE CARROS ELÉTRICOS

Conquanto o carro elétrico (ou a hidrogênio) pareça um meio de transporte racional -- econômica e ecologicamente falando – seu uso não acontece por um motivo simples: não é, tipicamente, um meio de transporte senão um objeto de luxo e ostentação para distinguir categorias de pessoas. Não é, definitivamente, o ideal de autonomia imaginado pelo usuário que deseja dar segurança à família ou então aparecer como forma de status social. Automóveis são construídos “as carradas” (desculpe o trocadilho) para permanecerem a maior parte do tempo parados no trânsito, nos estacionamentos ou em garagens por absoluta falta de usuários ou mesmo por impossibilidade física de uso simultâneo como acontece nos países industrializados (2 carros por habitante). O culto do automóvel agora que está atingindo a classes de baixa renda dos países em desenvolvimento que desejam participar tambem do sonho americano de consumo. Não chega a ser um meio eficaz de transporte visto que na maioria das vezes está parado ou transportando uma só pessoa.

APROVEITAMENTO SUSTENTÁVEL DOS POTENCIAIS DA AMAZÔNIA

(parte dois 11 páginas)
HUGO SIQUEIRA
Há mais coisas no ar do que os aviões de carreira. Aporelli.
È quase impossível passar ”em brancas nuvens” o “Belo Monte de problemas” que constitui o lançamento do megaevento prometido para o final do ano: A licitação da Usina de Belo Monte. Guardadas as devidas proporções, é comparável — em termos de marketing político ao lançamento do Pré-sal. De onde estiver, o saudoso Stanislau Ponte Preta (Sérgio Porto) estará assistindo a materialização — no besteirol do congresso — do seu famoso “FEBEAPÁ : Festival das Besteiras que Assola Este País. Não é para menos: um dos últimos e bons potenciais da região Amazônica comparável — como usina de fio d’água e em termos de potência instalada — à usina de Itaipu, mas de pequena capacidade de produção de energia.
Por traz “do Belo Monte” se esconde uma fauna exótica de marqueteiros políticos, lobistas, governadores, senadores, entre os quais nossa sumidade em matéria de energia, Lobão (o outro é claro!). De outro lado, os mais genuinamente interessados: índios, povos da floresta e ambientalistas, mineradoras, produtores de alumínio, técnicos e elevados interesses políticos que o evento propicia como véspera do ano eleitoral. O evento extrapola o mero interesse de técnicos, mineradoras, ambientalistas porque representa a oportunidade de mudança da estratégia seguida até aqui, nos rumos do planejamento energético e mineral. Técnicos e políticos depositam expectativas demasiado otimistas acerca das imensas riquezas que a realidade do campo gravitacional da Amazônia não mostra:
O que mais caracteriza os potenciais da região Amazônica é que em sua maioria são potenciais de fio d’água, de baixa altura local e situada em planície de baixa altitude, tecnicamente incapazes de constituir estoques de energia.
Comparativamente, o estoque de energia depende ao mesmo tempo da altura local e da altitude. A altura local limita o volume do reservatório em região de baixa declividade e a altitude limita o estoque que esse reservatório pode constituir.
Nada impede, entretanto, que a energia de recursos de fio d’água seja enviada para suprir demanda no período seco do Sudeste, cujos reservatórios podem ser mantidos cheios com a água economizada. Mas, esta é uma possibilidade ilusória, conquanto inteligente. Estoque de energia é uma variável sistêmica que não está localizada em um ponto determinado do sistema. É uma variável que pertence ao sistema como um todo, cujos componentes se transformam em energia elétrica nas diversas alturas das usinas de jusante do mesmo caminho da corrente do rio assim que o volume dos reservatórios de cabeceira libera água. Ora, não se pode reter água nestes reservatórios sem comprometer o funcionamento da usinas de jusante, de cuja vazão sua capacidade é dependente.
O que foi feito até agora nas primeiras usinas (Tucuruí, Madeira, etc.) é uma tentativa de extensão à região amazônica da mesma estratégia bem sucedida no Sistema Elétrico do Sudeste. Mas, o sonho de um sistema único interligado pode não ser atingível. Existem limitações de natureza física e econômica para impedir que os recursos potenciais da Amazônia sejam utilizados em sua plenitude e assim integrados, alem daquelas de cunho ambiental que por si só seriam suficientes:
São condições geográficas que determinam o fraco desempenho dos grandes potenciais da região amazônica, tanto do ponto de vista ambiental como econômico. Pequenos desníveis criados para geração de energia elétrica implicam em grandes reservatórios, dispendiosos e agressivos ao meio ambiente. Do ponto de vista econômico, a transformação se opera em regime de baixas velocidades, o que implica maior custo dos equipamentos, turbina e gerador e maiores custos de barragens e reservatórios.

A REALIDADE DO CAMPO GRAVITACIONAL

HUGOSIQUEIRA

Do ponto de vista do sistema energético, a região amazônica não é, tipicamente, uma bacia única integrada, mas várias bacias isoladas, cujos rios de planície não têm ligação física uns com os outros e nem com os rios do Sudeste o que é um obstáculo a integração. Geograficamente, rios de cada bacia têm pequena declividade e não suportam reservatórios de volume expressivo que não inundem, o que se traduz em impossibilidade técnica de reservatórios de regulação plurianual a semelhança do Sudeste. O relevo pouco acidentado na cabeceira de cada um destes rios é o responsável pela baixa eficiência do campo gravitacional — tanto no aspecto ambiental como econômico. O fator altura h, decorrente do relevo, não se reflete apenas no custo do equipamento, mas principalmente no custo do reservatório, raso e largo, com área inundada proporcionalmente maior, relativamente ao volume armazenado. Mas, o custo do reservatório não corresponde apenas ao valor imobiliário da terra inundada, o que seria algo suportável em uma região devastada como a do reservatório de Furnas, por exemplo. É o fato de a inundação ocorrer em área da floresta amazônica que torna o custo ambiental infinitamente maior e, portanto, o efeito altura mais evidente. Se não é aceitável um reservatório das dimensões do de Furnas em Belo Monte — e foi necessário reduzir sua área para diminutos 500 quilômetros quadrados, para que o licenciamento ambiental fosse aprovado — como justificar um reservatório inócuo, com área dez vezes superior, em qualquer reservatório de cabeceira dos rios Xingu, Tocantins, Tapajós ou Madeira?
O relevo já é um obstáculo natural, por isso construir reservatórios na Amazônia é “chover no molhado”, isto é, transformar a região mais inundada do planeta num gigantesco espelho d’água capaz de interferir com o clima. Seria a repetição na Amazônia da mesma experiência mal sucedida da construção de açudes que transformou o nordeste no semi-árido mais inundado do mundo.
Mas, se a região amazônica já é naturalmente molhada pelas enchentes, a construção de reservatórios mínimos não vai agravar os problemas de clima, já previamente determinado pelas enchentes naturais. Esta seria a condição a impor: os reservatórios não deveriam inundar mais do que as enchentes naturais.
Da mesma forma que a exploração dos recursos florestais da Amazônia pode ser conduzida de forma sustentável, por manejo limitado da quantidade, os recursos potenciais hidroelétricos tambem podem ter exploração sustentável, limitando intencionalmente a altura das barragens e, conseqüentemente, a superfície de alagamento dos reservatórios. É o baixo nível de aproveitamento de recursos, conhecido na literatura técnica por “Low Profile”
Uma solução de consenso inteligente sobre a utilização sustentável dos potenciais da Amazônia é o subaproveitamento, para ter em conta os prejuízos econômicos e ambientais dos grandes reservatórios. Ao reconsiderar a diminuição da altura nas represas das recém-licitadas usinas do Rio Madeira foi estabelecido um padrão para as demais usinas. A redução da altura não resulta em perda econômica propriamente dita — uma vez que o preço do Kwhora é bastante reduzido — mas em menor utilização dos recursos disponíveis em relação à máxima energia que seria obtida com a utilização de altura maior e, portanto, reservatórios mais extensos. Com a redução da capacidade instalada, o aumento no custo dos equipamentos e vertedores por unidade de energia produzida é mais que compensado pela redução no custo da barragem e reservatório — maior componente dos empreendimentos hidroelétricos — que praticamente deixam de existir. Significa apenas uma subutilização de todo o potencial disponível, o que tornou rentável o empreendimento. O emprego de usinas de fluxo de água (bulbo) adequadas para baixa altura de queda é o artifício que contempla custos ambientais e econômicos.

BAIXO NÍVEL DE APROVEITAMENTO EM CAMPO FRACO

HUGO SIQUEIRA

Os potenciais da Amazônia, vistos como promissores, estão sendo superestimados, se levados em conta fatores ambientais: ou são usinas de fio d’água, incapazes de constituir estoques de energia, ou são usinas de baixa altura que, para produzir energia de modo eficaz necessitam de reservatórios imensos. Subutilização ou “Low Profile” é a melhor maneira de ter energia de baixo custo e de preservar a floresta, sem gastar os recursos da natureza. Mesmo subutilizada a Região Amazônica continuará a fornecer energia barata capaz de suprir as necessidades próprias e ao mesmo tempo produzir insumos básicos por eletrólise de minérios, abundantes na região, e cujo aproveitamento não conflita com o meio ambiente.
Não é difícil mostrar que reservatórios não só são ambientalmente incorretos na região Amazônica, como impraticáveis tecnicamente. Tomemos como exemplo o reservatório de Furnas (1440 Km² de superfície alagada), que junto com Itumbiara (780 Km²) é o responsável pela maior parte do estoque de energia do Sistema Sudeste-Sul. O estoque de energia pode ser calculado pela expressão:
Estoque de energia ~ Volume armazenado X altitude
Como: Volume armazenado ~ Superfície alagada X Altura local
Resulta: Estoque de energia ~ Superfície alagada X Altura local X altitude
Os fatores altura e altitude são determinantes na constituição de estoques de energia. Como a altitude é um fator físico predeterminado, qualquer barragem só produz superfície alagada e custos sem produzir estoque de energia. Ainda que fosse aceitável a mesma superfície alagada de Furnas, o volume de água armazenado seria minúsculo e o estoque de energia desprezível.
Ordinariamente, os reservatórios da região amazônica têm o formato de uuuuuu alongado, rasos e largos, com elevada relação superfície/altura em relação aos reservatórios do Sudeste, Furnas e Itumbiara, que tem formato de V, estreitos e profundos, com baixa relação superfície/altura para o mesmo volume armazenado. Em outras palavras: a superfície de alagamento é inversamente proporcional à alturas de queda. Para ter o mesmo volume do reservatório de Furnas a área inundado em Jirau no Rio Madeira seria cerca cinco vezes maior, o que seria impensável. Ainda que fosse possível, a energia armazenada — produto do volume pela altitude — seria muitas vezes menor ou quase nada. Conclusão, feitos novos estudos para contemplar exigência dos ambientalistas acabou prevalecendo o bom senso: a área inundada foi substancialmente reduzida para cerca de 250 km² e o custo da barragem e reservatório praticamente deixaram de existir. A altura da barragem foi reduzida a dimensão necessária apenas para alojar as turbinas de bulbo e conter o vertedor dentro dos limites do rio. Para surpresa geral o lance dos consórcios vencedores da licitação ficou muito aquém dos limites máximos estabelecidos, como era de se esperar (78 e 71 R$/Kwhora, respectivamente a Jirau e Santo Antônio). Quais as lições que podemos tirar deste acontecimento inusitado?
1. Que não existe um conflito entre os ambientalistas — considerados idealistas e contrários ao progresso — e aqueles que se autodenominam progressista, como veiculado na mídia. Este é um falso dilema. Não é uma questão de vontade realizar o progresso. São fatos objetivos que o impedem: o campo gravitacional é pobre, só isso. Devemos reconhecer, entretanto, que foi graças ao trabalho persistente dos ambientalistas e da resistência dos habitantes da floresta que se tornou possível uma solução de consenso, com menor custo dos empreendimentos, inclusive ambiental.
2. A licitação da usina de Belo Monte, anunciada para este ano de 2009, promete surpresa maior, posto que seja talvez um dos últimos potenciais de grande qualidade da Amazônia. Novas controvérsias poderão surgir, uma vez que o novo projeto prevê diminuição da superfície inundada para cerca de 500 Km² (10 por 50 km), o que não deixa de ser auspicioso. Por outro lado, inclui um desvio do Rio Xingu e uma nova pequena usina de bulbo. Acreditamos que a área inundada possa ser ainda mais reduzida, pelo fato de tratar-se de uma usina de foz que, obviamente, não traz nenhum beneficio às usinas de montante.
3. Os reservatórios da Amazônia não armazenam energia. Logo, se os custos de barragem e reservatório forem reduzidos ao mínimo, os únicos custos incidentes serão, praticamente, aqueles relativos ao equipamento, turbina e gerador. Nesta condição a turbina de bulbo é imbatível comparativamente a turbina de vento. O custo de vertedores é uma parcela constante, projetada em qualquer caso para vazões seculares.
4. Os técnicos da Eletrobrás que foram extremamente competentes ao definir o sistema integrado do Sudeste projetam alongar a vida de um sistema de fonte única hidroelétrica ao repetir na Amazônia a mesma estratégia de sucesso utilizada no Sudeste com o emprego de reservatórios de acumulação. A integração elétrica é possível com envio de energia, mas, a integração elétrica por si só, não transfere estoques.
5. O fato mais importante que decorre das considerações acima é o reconhecimento de que o campo gravitacional na “Bacia Amazônica” é fraco e não pode produzir mais do que a soma simples de cada potencial individual, cuja produção energética total pode ser conhecida “a priori” por simples inventário. A interligação elétrica entre usinas não é condição suficiente para tornar o sistema “integrado” na acepção da palavra, tal como acontece no sistema da região Sudeste onde há ligação física entre os rios componentes da bacia, possibilitando a troca de estoques de energia. Em “teoria de sistemas” dizemos que os rios da Amazônia têm pouca “sinergia”.
6. Em termos comparativos o total de energia que pode ser gerada, em Megawatts médios, é menor do que a produzida no Sistema Elétrico do Sudeste, que tem muito menos água. Os potenciais da Amazônia podem ser equipados para produzir potência, mas, cessadas as enchentes, as turbinas ficam ociosas, não produzindo energia. “O imenso potencial energético da Amazônia” não passa de um mito criado pelo “ufanismo”. Somente o uso inteligente dos recursos potenciais da Amazônia pode levar a resultados positivos quando conjugados com a produção de comodities metálicas de alto valor agregado em lugar da exportação de minérios ou exportação de energia.
7. Aqueles dentre nós que tiveram a sorte de viver a experiência da construção do Sistema Elétrico do Sudeste podem constatar hoje — com o sistema praticamente completo — a extrema habilidade dos técnicos da Eletrobrás na condução do seu planejamento. É bem verdade que encontraram um sistema — singular e único no mundo — de rios interiores de forte integração regional, que foi a principal causa do extraordinário sucesso do Sistema Elétrico Brasileiro na segunda metade do século passado. Junto com Estados Unidos, Canadá e a antiga União Soviética, o Brasil foi dos países que mais soube tirar proveito do seu sistema ao projetá-lo com uma visão geral antes mesmo que a moderna “Teoria de Sistema” estivesse plenamente estabelecida. Nos países citados o Sistema é regionalizado e complementado por térmicas. Mas o Brasil pagou um preço elevado pela intuição dos técnicos. O fato de não ter petróleo para complementação térmica levou a um extremo endividamento externo pela concentração de capital em empreendimentos hidroelétricos de grande porte (ver “Energia para o desenvolvimento”, trabalho premiado de José Goldemberg, 1980). Só para se ter uma idéia é bastante comprovar que no curto período de 25 anos o Brasil já havia concluído a maioria dos potenciais disponíveis e o petróleo ainda não subira de preço. A recente instalação das duas últimas turbinas de Itaipu encerrou, praticamente, o planejamento do sistema na região Sudeste-Sul. Para comprovar a “grande sinergia” do Sistema Sudeste, basta observar que os reservatórios de Furnas e Itumbiara constituíram imenso estoque antecipado de energia e capital, cujos efeitos permaneceram ativos até os dias de hoje. Durante um longo período o Sistema permaneceu incólume, com um único “apagão” em 2001, que poderia ter sido evitado com um mínimo de usinas termoelétricas.
8. Estamos tão seguros de que a subutilização (não otimização) dos potenciais da Amazônia é o melhor caminho a trilhar nas próximas décadas que não temos nenhuma dúvida de que as usinas de bulbo acabarão dominando o contexto da maioria dos potenciais dos rios da Amazônia. A proliferação indiscriminada dessas usinas pode levar o país a incidir no mesmo erro do passado, isto é, investimento de capital na construção simultânea de várias usinas com a finalidade de assegurar energia, quando existem estratégias mais seguras de manter “energia garantida” com baixo investimento.
9. A abordagem de cada sistema é bastante distinta pelas suas peculiaridades inerentes: O sistema Sudeste foi projetado para vazões mínimas correspondente à média do “período crítico”, enquanto o sistema Norte está sendo projetado por vazões máximas (média do período chuvoso), ignorando o critério de risco para ter “energia garantida”. Como os reservatórios são mínimos, o custo das usinas de potência é baixo, cerca de 80 R$ por Kwhora. Portanto é previsível que um grande número de usinas seja licitado simultaneamente para ter garantia de que não ocorra tambem um “Período Crítico” nas distintas bacias, o que é bastante provável, especialmente neste tempo de mudanças climáticas. Deste modo, acabamos incorrendo no mesmo erro do passado, ou seja, antecipação de investimento, com acúmulo de dívida. Ora, tudo isto poderia ser contornado com mais motorização das usinas do Sudeste. Como já estão prontas, algumas delas já amortizadas, sua capacidade instalada pode ser incrementada com instalação de unidades de custo incremental muito mais baixo do que a construção de novas usinas e a energia assegurada por termoelétricas a gás de baixo custo de capital. Invertem-se os papéis: Ao invés do Norte suprir o Sudeste rico, este é que supriria demanda dos estados pobres no seu período de seca.
10. Não se trata apenas de restringir a ação predatória dos grandes produtores de alumínio — como é desejo dos ambientalistas. Estes já estão depredando a Amazônia ao exportar minério bruto (bauxita). Por outro lado cumpre lembrar que o setor de mineração respondeu por metade do saldo de nossa balança comercial em 2008. Portanto, conjugar produção de energia com exploração de minério na Amazônia confere vantagens competitivas ao país como exportador de comodities metálicas de alto valor agregado. Esta é uma alternativa promissora do Brasil ocupar esta faixa de mercado, em lugar de exportar minério bruto.
11. A presença das grandes mineradoras é um fato consumado, com o qual os estados da região Amazônica têm de conviver. São as mesmas multinacionais que produzem alumínio em outros países sob condição muito mais incorreta e dispendiosa Não bastasse a exploração da matéria prima os estados ainda terão prejuízos ambientais ao exportar energia — como comodity — para os estados ricos do Sudeste e Sul, que já contam com meios próprios de assegurar energia garantida.
12. Um meio indireto de armazenamento de energia consiste na produção de bens quando a energia é abundante e, obviamente, deixando de produzir quando é escassa, ou seja, produção sazonal de alumínio coincidente com oferta sazonal de energia. Estocar alumínio em lingote é mais barato do que estocar energia em reservatórios.
13. Alguns países estão utilizando indevidamente a eletrólise da corrente elétrica para produzir alumínio, cujo valor guarda estreita correlação com os preços do petróleo. Por isso os fabricantes de produto eletro intensivo são os melhores clientes para o tipo de energia sazonal que os rios da Amazônia podem produzir, os quais podem programar a produção de alumínio nos períodos chuvosos. São os mais aparelhados para se beneficiar desta estratégia.
14. O Governo Brasileiro vem manifestando o desejo de uma presença maior do estado no setor de mineração e energia de modo similar ao que vem fazendo com relação a exploração do petróleo. O objetivo é a mudança na lei de concessões com a finalidade de conferir a Eletrobrás um papel semelhante ao da Petrobras. O aproveitamento múltiplo por bacia é a melhor forma de contemplar os diversos setores envolvidos e, ao mesmo tempo, compensar os estados e habitantes da região pelos estragos ambientais causados por reservatórios. Assim, em lugar de licitar o aproveitamento de recursos individuais, hidroelétricos ou minerais, a melhor providência é a licitação de todos os recursos que interferem com o conjunto de atividades integradas: suprimento de energia, mineração, navegação e proteção adequada ao meio ambiente através de cláusulas restritivas de área inundada (altura). As mineradoras têm tradição consolidada tanto na produção de alumínio quanto energia elétrica e seriam os maiores interessados numa licitação conjunta de produção de energia e minério. O aproveitamento múltiplo é a forma de exploração capaz de integrar toda a região amazônica de modo a romper com a condição de isolamento a que estão submetidos os atuais ocupantes e permitir a exploração não predatória de recursos naturais (energia, minerais, agricultura) sob um regime de subaproveitamento planejado e sustentável.
15. Os ambientalistas constituem a última frente de resistência capaz de deter a escalada da construção de reservatórios e fiscalizar o aproveitamento sustentável dos potenciais da Região Amazônica.
16. As empresas multinacionais não estão fazendo nenhum favor em explorar o minério da Amazônia, apenas buscam seu interesse. Algumas delas já utilizam a energia de maneira adequada a agregar valor ao minério de que são concessionárias. Outras mantêm inexplorados por longos anos as chamadas “concessões de papel”, aguardando oportunidade de tarifas subsidiadas. Cabe ao governo — como dono dos recursos naturais previstos pelo Código de Águas — estabelecer políticas do interesse geral do país, bem como de romper com práticas nocivas ao interesse dos estados em particular.
APROVEITAMENTO MÚLTIPLO POR BACIA

A região amazônica não deve ser vista do ponto de vista estreito de cada uma de suas riquezas presumidas, mais de uma forma sistêmica do conjunto de suas riquezas e problemas inerente a ocupação desordenada. Pela planície úmida da Amazônia correm rios torrenciais de discreto número de bacias: Juruá, Tefé, Purus, Madeira, Tapajós e Xingu. A concentração das chuvas e o tamanho das bacias, mais do que a pluviosidade, é a causa principal da grande volume de água acumulada nos rios, capazes de produzir grande quantidade de energia a baixas velocidades em curto período. É impossível, geograficamente, construir reservatórios de grande volume que não formem espelhos d’água extensos. Se as alturas forem limitadas, os pequenos reservatórios não vão inundar mais do que as enchentes naturais. Mas, mesmo subutilizados (low profile), os potenciais da Amazônia ainda conseguem produzir energia a custos compatíveis (80 RS$/ MWHORA), relativamente a outras fontes de energia renováveis.
A usina de Belo Monte, considerada a “melhor do mundo” pela Eletrobrás, constitui um bom exemplo para explicar a diferença dos conceitos de energia e potência. De fato, tem tudo para se tornar um “bom” empreendimento: altura razoável de cerca de 90 metros, aliado a um reservatório diminuto, correspondente a ocupação da área de 400 Km² (10X40 km), inferior a área de qualquer açude nordestino ou município brasileiro. Ora, se não conseguimos discutir racionalmente um problema tão pequeno, em termos de reservatório, qual a dimensão que o mesmo problema vai ter quando as coisas se tornarem um pouco mais difíceis, demandando reservatórios que ocupem áreas maiores, da ordem das ocupadas por açudes nordestinos ou do total dos reservatórios do Sudeste? As usinas de montante certamente vão necessitar reservatórios de área muito superior a 400 km² para regularizar a vazão do no Rio Xingu, para que deixe de ser, tipicamente, apenas uma usina de fio d’água. Isto mostra que as restrições socioambientais vão continuar e a estratégia utilizada com sucesso no Sudeste não pode ser repetida simplesmente. O planejamento dos potenciais da Amazônia necessariamente deve ter um enfoque diferente. Os grandes reservatórios representam para a região amazônica o mesmo papel que os grandes açudes representam para a região nordeste: imensos espelhos d’água, “somando, hoje, o fantástico número de 70.000 reservatórios, tornando o Semi-árido, a região mais açudada do Planeta. Não há região no Globo, árida ou semi-árida, com tamanha capacidade de acumulação, um cubo de 37 bilhões de m³, um terço do que o São Francisco despeja anualmente no Atlântico. Numa distribuição geográfica eqüitativa disporíamos de um açude a cada 14 km² por toda a superfície do Polígono das Secas”. Mas há uma diferença sutil: enquanto os grandes reservatórios do nordeste ocupam áreas de caatinga, os reservatórios da Amazônia vão inundar regiões já naturalmente alagadas.

AMAZÕNIA: DECIFRA-ME OU TE DEVORO

HUGO SIQUEIRA


Ao longo do tempo a Amazônia foi alvo de intervenções desastrosas que marcaram profundamente o imaginário do povo da região. Custa a crer que depois de tantas intervenções, a floresta tenha permanecido incólume até os dias de hoje. Esta é a principal razão dos debates acalorados entre os diversos setores envolvidos, cada um tentando prevalecer seus argumentos como principal condicionante. Uns, tem uma visão demasiado otimista acerca da capacidade dos potenciais de suprir as necessidades do sistema Sudeste e Sul, uma visão exploratória que não contempla os riscos ambientais dos grandes reservatórios. Outros têm uma visão de um meio ambiente que precisa ser protegido a qualquer custo, como um “patrimônio da humanidade”, uma espécie de “santuário ecológico”.
Como conciliar opiniões distintas sem cair na posição maniqueísta: explorar, não explorar? Em outras palavras, é possível aproveitar de forma sustentável os potenciais da Amazônia da mesma forma que os recursos naturais? É possível encontrar um meio mais inteligente de armazenar energia sem a utilização de reservatórios? Existem formas diferentes de exploração dos diversos recursos?
Os problemas da Amazônia envolvem aspecto de natureza sócio ambiental, políticas, técnicas e econômicos. Do ponto de vista sócio ambiental as restrições são genuínas, em vista dos antecedentes de interferência indevida. Do ponto de vista técnico, o problema está mal colocado. Mesmo sem focar os argumentos apenas no aspecto ambiental, constatamos que, de todas as intervenções, até hoje não conseguimos encontrar uma sequer que não resultasse em fracasso retumbante. Com o despertar da consciência ambiental no fim do século o olhar do mundo inteiro estará voltado para a região amazônica, pondo em xeque questões de soberania. Não é só a questão de emissão de gases do efeito estufa, mas também o efeito de grandes reservatórios que constituem fator elevado de risco potencial que podem alterar o clima de forma ainda não conhecida. Será possível uma visão sistêmica que contemple o conjunto de todos os interesses envolvidos? Comecemos pelos interesses energéticos.
A Amazônia não deve ser vista apenas pelo ângulo particular ou do ponto de vista estreito de cada uma de suas riquezas presumidas, mas de uma forma sistêmica do conjunto de suas riquezas e problemas inerentes a ocupação desordenada. Assim, por exemplo, em lugar de licitar o aproveitamento de recursos individuais, hidroelétricos ou minerais, a providência que contempla todo o interesse envolvido é o aproveitamento múltiplo por bacia, ou seja, a licitação de todos os recursos que interferem com o conjunto de atividades integradas: suprimento de energia, mineração, navegação e proteção adequada ao meio ambiente através de cláusulas restritivas de área inundada (altura). Pela planície úmida da Amazônia correm rios torrenciais de discreto número de bacias: Juruá, Tefé, Purus, Madeira, Tapajós e Xingu. A concentração das chuvas, a configuração e o tamanho das bacias, mais do que a pluviosidade, é a causa principal da grande vazão dos rios, capazes de produzir grande quantidade de energia em curto período, ou seja, são rios de potência. É impossível, geograficamente, construir reservatórios de grande volume que não formem grandes espelhos d’água. Mas, mesmo subutilizados (low profile), os potenciais da Amazônia ainda conseguem produzir energia a custos compatíveis (80 US$/ Kwhora), relativamente a outras fontes de energia renováveis.
O aproveitamento múltiplo é capaz de integrar toda a região amazônica de modo a romper com a condição de isolamento a que estão submetidos os atuais ocupantes e permitir a exploração não predatória de recursos naturais (energia, minerais e agricultura) sob um regime de subaproveitamento planejado (sustentável).
A usina de Belo Monte, considerada a “melhor do mundo” pela Eletrobrás, constitui um bom exemplo que mostra a diferença dos conceitos de energia e potência. De fato, tem tudo para se tornar um “bom” empreendimento: altura razoável de cerca de 90 metros, aliado a um reservatório diminuto, correspondente a ocupação da área de 500 quilômetros quadrados (10 por 50 quilômetros), inferior a área de qualquer açude nordestino ou do menor município brasileiro. Custa a crer que, em tamanho espaço da Amazônia, os índios estejam confinados à grande curva do Rio Xingu. Ora, se não conseguimos discutir racionalmente um problema tão pequeno, em termos de reservatório, qual a dimensão que o mesmo problema vai ter quando demandarem reservatórios que ocupem áreas maiores, da ordem das ocupadas por açudes nordestinos ou do total dos reservatórios do Sudeste? As usinas de montante certamente vão necessitar reservatórios de área muito superior a 400 quilômetros quadrados para regularizar a vazão do no Rio Xingu, para que deixe de ser, tipicamente, apenas uma usina de fio d’água. Isto mostra que as restrições socioambientais vão continuar e a estratégia utilizada com sucesso no Sudeste não pode ser simplesmente repetida no Norte. O planejamento dos potenciais da Amazônia necessariamente deve ter um enfoque diferente.
Mas o custo do reservatório não corresponde apenas ao valor imobiliário da terra inundada, o que seria algo suportável em uma região devastada como a do reservatório de Furnas, por exemplo. É o fato de a inundação ocorrer em área da floresta amazônica que torna o custo ambiental infinitamente maior e, portanto, o efeito altura mais evidente. Se não é aceitável um reservatório das dimensões do de Furnas em Belo Monte e foi necessário reduzir sua área para diminutos 400 quilômetros quadrados — para que o licenciamento ambiental fosse aprovado — como justificar um reservatório com área cinco vezes superior, em qualquer reservatório de cabeceira dos rios Xingu, Tocantins, Tapajós ou Madeira?

A REALIDADE DO CAMPO GRAVITACIONAL

A Região Amazônica reúne as piores condições de armazenamento de energia por meio de reservatórios. A configuração não é, tipicamente, a de uma bacia única integrada, mas várias bacias isoladas, cujos rios não têm ligação física entre si, nem com os rios do Sudeste o que é um obstáculo a integração.
Considerando que, localmente, a maior parte dos potenciais tem pequena altura e que a superfície alagada deva ser limitada por questões sócio-ambientais, os novos reservatórios, comparativamente a Furnas, terão volumes reduzidos por dois fatores: altura e superfície alagada.
Na construção do reservatório de Furnas na década de 60, a superfície de alagamento de 1460 Km² atingiu vinte e cinco municípios, gerando enorme polêmica. É claro que reservatório desta dimensão não será ambientalmente viável na Região Amazônica, especialmente por se tratar de região de floresta tropical. A Área inundada será bem menor como mostra a recente licitação das usinas do Rio Madeira: 250 Km² ou 1/6 da área inundada por Furnas. Em Belo Monte no Rio Xingu, a superfície já foi reduzida para cerca de 500 Km² ou 1/3 da de Furnas.
Uma redução da altura útil de pelo menos 4 vezes, associada à redução da superfície alagada de 5 vezes, resulta em um reservatório de volume útil 20 vezes menor do que o reservatório de Furnas. Ocorre ainda que, geograficamente, os potenciais estão situados em planície de baixa altitude, o que limita ainda mais o estoque de energia produzido pelo reservatório. Considerando os três fatores, superfície, altura útil e altitude o estoque de energia produzido por usinas do tipo daquelas do Rio Madeira será inferior a 1% daquela produzida pelo reservatório de Furnas.
Redução da altura implica em menor capacidade de produzir energia de cada potencial, o que significa maior custo de equipamento por kW instalado (aumento do numerador e diminuição do denominador). Entretanto, com reservatórios mínimos os custos de barragem e reservatório — maiores dispêndios dos empreendimentos hidroelétricos — praticamente deixam de existir. Com isso, o custo do Kwhora fica bastante reduzido, como mostra a recente licitação das usinas do Rio Madeira. O único que permanece constante é o custo dos vertedores, os quais, necessariamente, devem ser projetados para vazões seculares. Qualquer aumento de altura no sentido do aproveitamento de todo o potencial resulta em maiores custos de barragem e maiores danos ambientais. Não podendo contar com ganhos sinérgicos resultantes da integração física, o potencial de cada bacia de rio fica restrito à soma simples de cada potencial individual, facilmente calculado por inventário. Deste modo, a contribuição que os rios da Amazônia poderiam oferecer — como suprimento de energia ao Sistema Sudeste nos períodos de seca — é muito menor do que se esperava inicialmente. Grosso Modo mal daria para uma década com crescimento anual da demanda de 4%, ou seja, cerca de 50000 MW de capacidade instalada. Nesta avaliação, não foram incluídos os investimentos necessários à interligação de usinas e centros de carga separados por distância superior a três mil Km, para os quais não existe tecnologia suficiente em nenhum lugar do mundo.
A nosso ver, a melhor destinação para os potenciais da Amazônia seria a estocagem local dos produtos que a energia pode produzir especialmente as comodities metálicas de alto valor agregado.
A fim de evidenciar a pouca eficácia do campo gravitacional nos rios da Amazônia seja o exemplo das usinas de Jupiá e demais a jusante na planície de baixa altitude do Rio Paraná até Sete Quedas. São usinas de pequena altura em torno de 20 metros, lentíssimas, que jamais teriam sido construídas se não fizessem parte do Sistema integrado do Sudeste como um todo. Contaram com reservatórios de montante que, inclusive, aumentaram energia firme produzida por elas. Ora, os rios da Amazônia tambem se situam em planície de baixa altitude e as alturas foram intencionalmente reduzidas para não alagar áreas inutilmente. Entretanto, não podem contar com nenhum reservatório de acumulação a montante, portanto, não ganharão sinergia de um campo gravitacional que é esparsamente integrado e ineficaz. O expediente da utilização de turbina de bulbo não altera o custo do equipamento: apenas substitui a solução tradicional de enormes geradores por pequenas unidades em maior número. Diante da impossibilidade de ter reservatório de acumulação, a altura poderá ser até inferior ao desnível natural. De qualquer forma, mesmo turbinas de bulbo serão lentíssimas e de custo elevado devido à baixa velocidade de escoamento dos rios amazônicos.
Se for seguido o mesmo critério das usinas do Rio Madeira no que respeita superfície de alagamento, o inventário dos potenciais individuais revelará um potencial total aquém do esperado, o que não justifica o dispêndio de capital em linhas de transmissão que se tornará ocioso em tão pouco tempo.

Diferentes visões:

Lago de Furnas

Lago de Furnas
Pesqueiro do Areado