domingo, 15 de agosto de 2010

A NATUREZA LIMITADORA DOS PRINCÍPIOS

“A usina termonuclear é o modo mais ineficiente de produzir aquecimento, simplesmente porque está condicionada a natureza limitadora dos princípios da termodinâmica”. Não pelo processo em si, caso houvesse um meio de utilizar o calor diretamente. Mas, por questão de segurança, o calor produzido pela reação nuclear é obrigado a passar por pelo menos três circuitos fechados, trocadores de calor com baixo rendimento. Alem disso, é obrigada a recorrer a formas indiretas e redundantes de transformação de calor em energia elétrica e desta em calor novamente, com o mesmo inconveniente da usina térmica convencional a vapor, de baixo rendimento. Reúne tecnologia avançada de processo, com tecnologia ultrapassada de transformação. Mas, em que pese o preço elevado do kW instalado, não é impeditivo que venha a ser utilizada pelos países industrializados em condições extremas.
A maneira mais eficaz de produzir calor é através da queima direta de combustível e, não por coincidência, o aquecimento é a maior demanda dos países industrializados de clima frio (58% nos Estados Unidos). O modo mais barato de produzir trabalho mecânico é a utilização dos potenciais hidroelétricos e a energia de acionamento é a maior demanda dos países em desenvolvimento (50%). Não é, por acaso, que os últimos potenciais inexplorados se encontrem nos países em desenvolvimento (700 GW). Tambem não é surpresa nenhuma que o combustível tenha se tornado escasso (fósseis e biomassa). Ambas as formas operam com elevados rendimentos tanto na produção (80%) quanto no consumo (cerca de 70%). As demais formas de energia têm rendimentos menores seja na produção e/ ou no consumo.
O transporte, maior consumidor de combustível, é a segunda maior demanda dos países industrializados (34%) e a primeira dos países em desenvolvimento (50%). No entanto, o mundo todo continua utilizando o motor à explosão, um meio bastante ineficiente de produzir energia de acionamento.
Alguns exemplos de utilização inadequada ou ineficiente:
• Queimar bagaço de cana é uma forma eficaz de gerar “calor de processo” mas, não é a melhor forma de produzir eletricidade (térmica a vapor).
• A utilização de chuveiros elétricos é uma forma de esbanjar energia. Usar energia elétrica já produzida por termoelétricas convencionais ou nucleares para aquecer residências, que é maior necessidade dos países industrializados (58%), é uma forma cara e redundante de transformar calor em calor (ver figura 1).
Ironicamente, o aquecimento solar direto, que, sem dúvida, é a melhor forma de produzir calor, não está plenamente disponível para os que dele mais precisam, os países de clima frio. Nos países tropicais, é desnecessário.
*** As usinas Henry Bordem, Jupiá e Furnas têm todas a mesma potência, aproximadamente, no entanto o custo por kW instalado é o menor na primeira, e o maior na segunda. A diferença é visivelmente comprovada pelas dimensões, vazão e rotação de cada usina como é mostrado na tabela 8. Quanto maior a rotação (associada a velocidade e altura da queda), maior a eficiência da transformação e menor o custo por kW instalado. Exemplo, ao contrário do que muitos imaginam, o motor a gasolina é mais eficiente que o motor diesel da mesma potência. Turbinas a gás são muito velozes (1800 ou 3600 RPM) e, por isso, muito baratas.
Tabela 8 – Parâmetros e Custos aproximados de usinas e motores
Potência
MW Altura
metros Diâmetro
metros Rotação
RPM Custo
US$ /kW
Furnas 1240 120 8 ~750 ~1000
Jupiá 1222 18 20 ~300 ~2000
Henry Borden 1200 700 3 1800 ~300
Motor diesel 1200 -eficiente
Motor a gasolina 5000 +eficiente
Turbina a gás 2 3600 ++eficiente
Turbina de avião 1 6000 +++eficiente

*** A usina de Jupiá tem seis vezes mais vazão do que Furnas que, por sua vez, tem queda seis vezes maior. Ambas têm a mesma potência instalada, obviamente. Era de se esperar que tivessem o mesmo custo por kW instalado, entretanto não é assim porque os geradores de Jupiá têm maiores dimensões (20 metros de diâmetro, Furnas 8 metros de diâmetro) e, portanto, maiores custos na mesma proporção.
Nos primeiros 25 anos depois de 1950, foram utilizados todos os potenciais a montante de Ilha Solteira que está aproximadamente a 250 metros do nível do mar, constituídos por usinas hidroelétricas extremamente econômicas de alta queda. Esta é a razão objetiva do sucesso alcançado. Todos os demais potenciais a jusante no Rio Paraná, que têm baixa queda, deveriam ter sido postergados, inclusive Itaipu, por terem custos elevados (>2000 US$ /kW instalado) e por isso mesmo considerados “faraônicos”. Este foi o grande equívoco dos outros 25 anos da última década, que estão querendo repetir agora, em um momento de recessão mundial e de grande escassez de capital: As usinas do Rio Madeira, recentemente licitadas. E justamente agora, que as boas condições surgem, estamos cometendo erros grosseiros ao apressarmos a construção das usinas do Rio Madeira: Jirau e Santo Antônio. Não precisa ser especialista, engenheiro ou economista para perceber o erro. Apenas bom senso e uma visão de boiadeiro é suficiente. Não precisa ser economista para saber que o mundo vai passar por recessão, com baixa atividade econômica. Com isso o preço do petróleo, do etanol e dos alimentos está caindo e a taxa de juros praticada vai subir, com a escassez de capital. Ora, justamente agora, estamos gastando capital precioso na construção de hidroelétrica custosa para ficar parada a noite, nos feriados, domingos e meses de baixa atividade econômica (especialmente agora). É bem provável que esta usina fique parada em 70% do tempo, por falta de carga e inexistência de tecnologia para transportar energia daquelas distâncias.
“Aneel pede pressa para iniciar obras de Jirau: o país terá de acionar usinas térmicas e lançar mais de 600 mil toneladas de gás carbônico na atmosfera (Folha, 14/10/2008)”.
Agora que temos etanol e petróleo barato (0,50 US$/litro), não podemos utilizar termoelétricas a gás ou combustíveis líquidos, a um quarto do custo de capital, apenas porque vamos lançar gás carbônico na atmosfera? É, tem gente que ainda acredita em papai Noel: leva a sério essa “nova doutrina do aquecimento global”. Justo agora, que países industrializados estão postergando a construção de usinas termonucleares três vezes mais caras que hidroelétricas, para consumir petróleo no aquecimento de residências (42% do consumo mundial de energia). Com isso vão lançar milhões de toneladas de gás carbônico na atmosfera. Será que estes países levam a sério o aquecimento global?
Outros potenciais da bacia amazônica, como Belo Monte, têm custo do kW instalado inferior aos do Rio Madeira (metade), bem como pequenas centrais hidroelétricas (PCH) tornadas econômicas atualmente e que estão sendo disputadas nas reservas indígenas. Apesar do custo elevado, estas PCH se justificam, em virtude do elevado crescimento do estado de Rondônia.


O SURGIMENTO DOS MITOS

A humanidade toda se sente ameaçada ante a possibilidade que venha faltar alimentos, terra, combustível. As preocupações são genuínas. Mas, devemos lembrar que a humanidade já se confrontou com problemas maiores no passado. A melhor maneira de afastar esses temores e ganhar tempo, até que novas tecnologias estejam disponíveis, é investigar como demanda e oferta de energia se combina no presente, bem como sua evolução futura. Cada país deve fazer a escolha das melhores alternativas de produção e consumo de energia, como aponta José Goldemberg no seu trabalho premiado “Energia para o Desenvolvimento”, de 1988, cuja principal conclusão é a seguinte:
“Os países em desenvolvimento não deveriam trilhar os mesmos caminhos de desenvolvimento do Norte, mas buscar novas direções e assumir os riscos da inovação em áreas especialmente promissoras”.
Em lugar de prever o futuro, países em desenvolvimento devem ler o passado, não para copiar, mas para não incorrer no erro de soluções que se tornaram inviáveis naqueles países, simplesmente porque as condições mudaram. Ao invés de planejar, os diversos países devem “garimpar” as alternativas promissoras próprias.
Os países em desenvolvimento não precisam, necessariamente, repetir os mesmos passos dos países industrializados, evitando assim escolher alternativas que se tornaram inviáveis nestes países. Podem queimar etapas com melhores escolhas. Nem os países industrializados precisam, hoje, retroceder ao passado do industrialismo para proteger seus empregos.
Conclusões de Malshal McLuhan, o papa da comunicação, referenciado por L.O. Lima em “Mutações em Educação segundo McLuhan”, 1982, 16º edição, Vozes RG:
“Mas terá cabimento, num país subdesenvolvido, tomar-se como meta a reflexão vinda de (McLuhan) de uma civilização pós-industrial como a americana? Muitos pensadores estão convictos de que a reflexão prospectiva – dedução do statu quo dos países altamente desenvolvidos – é a melhor solução para os países subdesenvolvidos: assim, esses países evitarão incorrer (por ensaio e erro) nas soluções que hoje se mostram inadequadas naqueles”. Por outro lado, o processo civilizatório atual -- dentro das defasagens internacionais – mostra que é possível queimar etapas: a eletronização da Amazônia, por exemplo, é uma comprovação de que se pode antecipar as comunicações que (se tivessem que seguir as etapas históricas) passariam antes pelas estradas a pé, a cavalo, por água, estradas de rodagem, estradas de ferroe, finalmente pelo avião, antes de chegar as microondas e aos satélites”.
As circunstâncias históricas mudam de tal forma que muitas soluções, consideradas anacrônicas, podem ser ressuscitados com sucesso, graças à nova tecnologia da biogenética. Assim, o aço brasileiro baseado em carvão vegetal, vista por muitos como anacrônica, compete bem nos mercados, atualmente, porque sua indústria está muito mais adiantada em relação à antiga tambem baseada em carvão vegetal, há muito abandonada pelos países industrializados, alem do que a tecnologia da biogenética favorece países tropicais. As árvores utilizadas na Suécia levam trinta anos para serem aproveitadas, enquanto as florestas cultivadas do Brasil são cortadas com seis anos. Os ganhos de produtividade das florestas cultivada no Brasil aumentaram em cinco vezes, pelo emprego de “clones” de eucalipto e melhores técnicas de cultivo e de aproveitamento do carvão vegetal. È um feito surpreendente que mostra o caminho a ser seguido pelos americanos e chineses que insistem nas grandes siderúrgicas a carvão mineral. O próprio “Gasogênio”, uma relíquia do passado da segunda guerra, pode ser ressuscitado como uma alternativa promissora para países pobres carentes de petróleo, mas ricos em biomassa.
Para ilustrar o descasamento entre países e como etapas podem ser queimadas, recorremos às conclusões de trabalho do autor destas linhas:
Como, fatalmente toda energia do futuro passará pela queima de algum combustível, este fato não representa desvantagem para os países em desenvolvimento, ao contrário dos países industrializados que recorrerão à energia nuclear, mais cara, para obterem energia de aquecimento. Quando houver predominância de térmicas nos países em desenvolvimento, estes poderão afinal ficar livre do “critério de risco”, utilizado pelos planejadores na década de 50: as novas usinas hidroelétricas da Amazônia não precisarão estar condicionadas ao atendimento da carga em qualquer circunstância, como antes, quando o sistema foi exclusivamente hidroelétrico. Estas, bem como as atuais hidroelétricas, não serão mais responsáveis pelo atendimento das solicitações instantâneas da carga, que passará a ser suprida ocasionalmente pelas termoelétricas (de custo fixo mais baixos) que serão maioria. Tambem funcionarão a plena potência em todas as condições de vazão, a qual não precisa ser garantida. A “energia garantida” não precisará ser aquela do “Período Crítico”, mas a máxima que as hidroelétricas puderem produzir, em qualquer condição de vazão, limitada apenas à potência instalada de cada usina. Mesmo que não exista carga, esta poderá ser criada artificialmente para a produção sazonal, a baixo custo, de comodities metálicas de alto valor agregado, intensivas em energia elétrica (eletrólise a quente), tornando assim em instrumento eficaz de planejamento da produção industrial. A excessiva motorização das usinas hidroelétricas atuais, que foi motivo de muitas críticas, como “obra faraônica”, agora por motivo de mudanças históricas, felizmente encontra uma alternativa bastante promissora de utilização (“O Sistema elétrico do Brasil”, janeiro de 2005, do autor).

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